sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Busca pelo vencedor clássico

 


Calandagan, nomeado 2025 Cartier Horse of the Year.




Nessa busca pelo vencedor clássico apresentamos dois cavalos que possuem forte relação com o Brasil, Calandagan e Rayif. Seus avôs maternos serviram no Brasil e por aqui tiveram suas filhas pouco exploradas como reprodutoras, fato que também se apresentou na Europa.

A escola Vuillier nos ensinou que nenhum cavalo que foi excepcional nas pistas e fracassou como pai de ganhadores deve ser descartado como avô materno, o importante é o método. O exemplo mais claro e marcante é o de Secretariat, um fracassado pai clássico e alçado a chef-de-race pela produção de suas filhas.

A situação de Secretariat é facilmente explicável, em sua época foi o garanhão que mais serviu éguas nos EUA e mesmo com sua produção não correspondendo nas pistas, a criação norte-americana, como que tomada por um vício incontrolável, nunca deixou de o apoiar. Essa enorme quantidade de suas filhas com éguas de melhor qualidade tinham que obrigatoriamente serem utilizadas. E foram servidas nesses haras de ponta por seus melhores garanhões, era a opção que se apresentava e Secretariat, felizmente para a criação mundial, mostrou ao que veio.

Considerando questões comerciais, perfeitamente compreensíveis, as filhas de Sinndar e Holy Roman Emperor não tiveram esse mesmo apoio. Mas, hoje Holy Roman Emperor encontra-se na 10ª colocação europeia de avôs maternos e Sinndar com raras filhas na reprodução além de Calandagan, também é avô materno de Trading Leather (Irish Derby, G1), Flotilla (Poule d'Essai des Pouliches, G1 e Breeder's Cup Juvenile Fillies, G1), Encke (St Leger S., G1), Maiguri (Grand Criterium, G1), Genius Beast (Classic Trial S., G3), Emiyna (Athasi S., G3), etc.

Devemos sempre atentar que genéticas "alternativas" e "fora de moda", ou seja, não inseridas nos interesses econômicos dominantes no PSI, possuem plena condição para produzir cavalos de categoria.

Voltemos a Calandagan e Rayif.

Em Calandagan tem-se a combinação Northern Dancer x Secretariat livre de endogamia em Mr Prospector, sobre linhagem materna brilhante em suas duas vertentes. Esse tipo de combinação, apesar de clássica e vitoriosa, encontra-se hoje fora do radar da maioria dos profissionais responsáveis pela elaboração de cartas de monta. Como exemplos do passado identificam-se Storm Cat, Danzig, Dehere, Summer Squall, Secreto, etc.

Essa combinação apesar de hoje ser rara, apresentou na última década um índice de 82% em vencedores.

Na geração 2024 do Haras Palmerini apresentamos 2 produtos que cumprem esse critério, Satisfied Cry e Salute Rafaela. 

Obs.: Trading Leather (Teofilo) em nossos registros, salvo correção, se apresenta como o outro único indivíduo que corresponde a combinação Galileo x Sinndar. Então temos 100% de aproveitamento na alta esfera clássica desse cruzamento.



Rayif


Em relação a Rayif fica evidente quando a diretriz de uma criação privilegia a técnica acima de qualquer outro aspecto. O garanhão líder Sea The Stars pertence ao Aga Khan Studs, mas, Ravisa foi direcionada a seu filho Sea The Moon (G1), um garanhão externo. A razão dessa escolha é simples e clara, aplicação de um sistema.

Sea The Moon é neto de Monsun. Vemos que alguns profissionais menos atentos quanto à pedigrees "fora de moda" desprezam a descendência de Monsun. No Brasil temos raras filhas dos ignorados Manduro (7.69% vencedores black-type) e Shirocco (5.95% vencedores black-type) exploradas pelos haras brasileiros. Manduro é hoje o 40º colocado na estatística europeia de avôs maternos, à frente de Singspiel, Duke of Marmalade, Zoffany, Footstepinthesand, Kendargent, Soldier Hollow e Raven's Pass. 

Em programas de criação, ao pensarmos no cruzamento entre as linhagens Danehill x Monsun procuramos reunir a velocidade e força de Danehill com a resistência e stamina de Monsun. Alcina, Secessio e Rayif são alguns exemplos dessa combinação. Enquanto Sea The Moon, Soudania e Sosie, entre outros, são frutos da combinação Sea The Stars x Monsun. Ao utilizarmos Sea The Stars estamos em busca de sua classe. Sea The Stars x Danehill ofereceu Legend of Time, Hanalia, Lavender's Blue, Stellar Mass, etc.

O pedigree de Rayif é um exemplo de convergência entre 3 linhagens que se complementam geneticamente, além de ressaltar que inbreeding sobre Danzig através de Danehill é uma leg conhecida entre especialistas por ser um ponto de força.





"Não tenho bases científicas para o nosso sistema e nenhuma explicação genética sobre os nossos cavalos e seus resultados. Mas ele funciona, pois produz consistentes resultados ao longo dos anos." Germaine Vuillier





segunda-feira, 10 de novembro de 2025

As Reines-de-Course

 

Mumtaz Mahal


O conceito de reines-de-course foi criado em 1985 por Ellen Parker, inspirado em éguas que tiveram grande sucesso nas pistas de corrida e que, subsequentemente, se tornaram reprodutoras excepcionais, produzindo descendentes de alto nível. Sendo que a maioria das reines-de-course se elevaram a categoria de matriarcas, pois suas filhas sustentaram na classe sua linha ventral.  

Essas éguas, como dito acima, são responsáveis por fundar veios maternos que influenciaram de forma consistente o melhoramento do PSI e que, quando se apresentam consanguíneas tendem a fortalecer um pedigree. Mas, não deve-se relacionar consanguinidade sobre as reines-de-course com a teoria Rasmussen Factor (endogamia com fêmeas dentro de cinco gerações) que é uma ideia extremamente abrangente e já comentada em artigo anterior. Em termos práticos não importa o entendimento de Rasmussen para o que seja uma égua "superior", na determinação da eficiência (ou falta dela) do Rasmussen Factor, de fato, endogamia sobre fêmeas só funciona estatisticamente quando elas são reines-de-course

Em estudo compreendendo período de 2003-2007 nos EUA foram encontrados 172 vencedores de stakes com endogamia materna nas cinco primeiras gerações, 144 (83.72%) eram consanguíneos sobre reines-de-course e 28 (16,28%) consanguíneos sobre éguas comuns. 

No sistema de Dosagens de Varola e posteriormente ampliado por Roman, essas éguas de elite, apesar de não formarem parte de sua imagem gráfica, são consideradas fontes cruciais na transmissão de velocidade e resistência para as gerações seguintes e fazem parte do raciocínio de forma off-label. Esse entendimento me foi passado pessoalmente pelo Dr. Varola em 1974 quando estava elaborando sua teoria da Tipologia Funcional que resultou no sistema de Dosagens.

Dr. Franco Varola, que morou no Rio de Janeiro, era um assíduo frequentador das reuniões que ocorriam na residência do Dr. Reynato Sodré Borges, quando este residia no Ed. José Mariano, Copacabana, em monumental apartamento de Mariano Raggio e prestava consultoria ao Haras Sideral.

Os pensamentos de Vuillier, Varola e Parker utilizados para determinar chefs-de-race e reines-de-course são conceitos pragmáticos e consequentemente dentro dessa lógica não se encerraram com os seus falecimentos. Tanto que Roman ampliou Varola e publicou o excelente "Dosage Pedigree & Performance". Qualquer e todo estudioso do PSI pode ampliar para sua utilização ou publicar em qualquer veículo as suas listagens de chefs-de-race e reines-de-course... Alguma dúvida que Tapit seja um chef-de-race brilliant/intermediate? 

Convivi por anos com o Dr. Varola e nunca ouvi de sua voz que ele havia delegado o "direito" de exclusividade para quem quer que seja sobre o seu pensamento em relação a nomear chefs-de-race e perpetuar "oficialmente" sua teoria.



A questão das reines-de-course está diretamente relacionada a herança mitocondrial e outras interações genéticas positivas. Uma compreensão adequada da função do DNA mitocondrial é como a "casa de força" de cada célula, o motor que realmente produz a energia para todas as formas de vida orgânica e essas potências genéticas só são transmitidas pelas fêmeas de quaisquer espécie. 

As reines-de-course desempenham um papel marcadamente mais profundo na produção de campeões e na perpetuação de uma família vencedora  durante gerações.

A última listagem de reines-de-course atualizada por Ellen Parker possui mais de 580 nomes, e não cabe nesse artigo publicar essa extensa listagem já que ela é de fácil acesso a qualquer estudioso do assunto. Em lista própria ampliamos em mais 379 nomes essa listagem original, evidentemente utilizando os critérios de Ellen Parker.



"No final das contas, um bom cavalo é, simplesmente, um garanhão cruzado com uma égua positiva de boa família. Tentar complicar é uma perda de tempo." Ellen Parker




segunda-feira, 3 de novembro de 2025

"Rasmussen Factor" em números.

 



Dentre as inúmeras teorias que circulam no universo da criação do PSI quanto a critérios que objetivam sucesso em um cruzamento, apenas uma foi extensivamente posta à prova na prática. E essa teoria é a metodolgia Vuillier, responsável até o momento em que esse artigo é escrito por 175 provas de Grupo 1 vencidas pela criação Aga Khan, número jamais atingido por outra criação na história do PSI. Sendo que na última década foi responsável por 31 conquistas G1, com 18 distintos atletas.

Em relação a teoria de Dosagens de Varola e atualizada por Roman, ela analisa a prepotência genética de um garanhão elevado a chef-de-race na transmissão de determinada ou determinadas características funcionais que se perpetuam de forma dominante ao largo das gerações de sua descendência e não possui nenhuma relação com a expectativa na obtenção de sucesso. Evidentemente ela pode ser utilizada em uma simulação de cruzamento, para obtenção de uma visão macro da combinação estudada.

Dito isto, apresentamos artigo sobre o Rasmussen Factor:

O "Fator Rasmussen" (ou RF) é um termo usado para descrever a consanguinidade com famílias femininas superiores através de diferentes indivíduos. Conforme definido pelos idealizadores e desenvolvedores da ideia, o falecido colunista de "Bloodlines" do Daily Racing Form, Leon Rasmussen e seu colega Rommy Faversham, a consanguinidade deve ocorrer através do pai e da mãe (ou seja, em ambos os lados do pedigree) e a duplicação da fêmea consanguínea deve estar dentro de cinco gerações.

Assim, a consanguinidade com irmãos completos ou meio-irmãos dentro de quatro gerações se qualificaria, enquanto a consanguinidade como mesmo filho não. Rasmussen e Faversham afirmam uma vantagem da consanguinidade RF com base em um estudo de participantes nas reuniões de 1996 no encontro Oak Tree em Del Mar. Eles encontraram que 4.0% dos participantes exibiam o RF em seu pedigree, enquanto 6.0% dos vencedores de stakes graduados na década de 1990 apresentavam o mesmo padrão. A conclusão de ambos foi que a consanguinidade RF ocorria mais frequentemente entre os corredores da classe principal do que na população geral. Isso equivaleria a um valor de impacto (IV) de 1.50. Em 2001, o especialista em genealogia Roger Lyons questionou a importância do estudo Rasmussen/Faversham, observando que a consanguinidade não é distribuída de maneira uniforme na população do PSI, sendo que os vencedores de stakes de nível superior possuem mais consanguinidade de quinta geração e além, de todos os tipos, do que os corredores menos talentosos.

Segundo Lyons, isso resulta do fato de que "ancestralidades que se misturam nas margens da raça têm menos em comum entre si do que ancestralidades que são acompanhadas pelo fluxo principal". Em outras palavras, corredores de classe superior descendem de um espectro mais restrito de material genético do que a população em geral. Suas evidências vêm de dados sobre as frequências de RF nas vendas de potros de um ano em 1998 e 1999. Lyons descobriu que a porcentagem de potros de um ano RF nas vendas de julho em Keeneland, agosto em OBS e setembro em Keeneland excedia a porcentagem de potros de um ano RF nas vendas de julho em FTK, agosto no Texas, agosto na Louisiana, agosto em Washington e agosto em CTS. Ele observou que a criação de potros de um ano nas três primeiras vendas, de maior qualidade, era mais típica de vencedores de stakes graduados do que a criação dos potros nas outras vendas, especialmente na venda da Califórnia. Não deveria ter sido surpreendente então que Rasmussen e Faversham tenham encontrado o resultado que encontraram. Infelizmente, eles estavam comparando populações dissimilares, o que torna o IV observado por eles pouco confiável. Ao mesmo tempo, Lyons também foi rápido em apontar que o desempenho superior dos vencedores de corridas por categorias não está necessariamente relacionado ao aumento de  consanguinidade. 

Como RF parece ser de interesse geral para a comunidade do PSI em geral e para os criadores em particular, e porque pesquisas significativas sobre o RF são relativamente limitadas, empreendemos um estudo próprio que examina a importância do RF no pedigree dos garanhões, tanto em sua carreira de corridas quanto, em menor grau, em sua carreira reprodutiva. A população em questão consistiu em todos os garanhões encontrados no Registro de Garanhões anunciados no The Blood Horse Stallion Register de 2003. Embora não seja uma população verdadeiramente aleatória, é certo que a inclusão deles é independente de qualquer associação com a RF. Ao todo, há 817 garanhões incluídos na análise. Destes, 49 apresentam o padrão RF, enquanto 768 não apresentam. Além disso, não compararemos populações separadas e distintas como fizeram Rasmussen e Faversham. Em vez disso, mediremos a distribuição dos efeitos dentro da única população de garanhões anunciados. Dessa forma, esperamos evitar quaisquer problemas potenciais decorrentes do uso inadequado de grupos de controle. Para este exercício, a classe de corrida foi dividida em sete categorias, designando o mais alto nível de sucesso nas corridas:

1 - Vencedor de Grupo 1

2 - Vencedor de Grupo 2

3 - Vencedor de Grupo 3

4 - Vencedor de provas não graduadas

5 - Vencedor de corridas de permissão (allowance)

6 - Vencedor iniciante (maidem)

7 - Não vencedor

Um grupo separado compreendia garanhões que não participaram de corridas.

A Tabela 1 resume os resultados desses garanhões que competiram e inclui informações sobre largadas, ganhos e habilidade em corridas.


As únicas diferenças aparentes estão nos ganhos médios e nos ganhos médios por corrida, onde parece que os garanhões RF têm uma vantagem distinta. No entanto, os valores medianos respectivos são virtualmente idênticos. Se removermos os dois maiores ganhadores de cada grupo, as médias mudam drasticamente para $ 620.554 para os garanhões RF e $ 666.117 para os garanhões não-RF. Claramente, as médias são distorcidas por ganhos incomuns na faixa mais alta. Os dois principais da categoria RF são Fantastic Light e Singspiel, enquanto os da categoria não-RF são Skip Away e Silver Charm. A distorção nos ganhos médios em comparação aos ganhos medianos pode ser atribuída às estruturas de prêmios inflacionadas de várias corridas importantes nos EUA, Japão, Dubai e Hong Kong. No geral, entretanto, os dados indicam que não há diferença na capacidade de corrida entre os garanhões RF e não-RF.

Um exame mais detalhado de RF e da classe de corrida é apresentado na Tabela 2.



A variação em cavalos RF por classe de corrida é mínima, embora a média de 6.3% para vencedores de stakes graduados seja ligeiramente maior do que a média de 5.3% para vencedores de stakes não graduados. No entanto, um teste qui-quadrado envolvendo as duas populações (RF e não-RF) fornece um valor de P de 0.58, indicando que os grupos não são diferentes em um sentido estatisticamente significativo. Além disso,o aumento na % RF de vencedores G1 para G2 para G3 é o oposto do que se espera de um efeito RF que favoreça a performance. 

A última análise de RF e desempenho em corridas para garanhões envolve a distribuição da classe de corrida dentro de cada grupo, como mostrado na Tabela 3.

Mais uma vez, as distribuições são essencialmente indistinguíveis e sugerem ainda que não há efeito sobre o desempenho em corridas decorrente da presença ou ausência de RF. Por fim, examinaremos brevemente a relação entre RF e o desempenho reprodutivo dos garanhões. Nesse caso, isolamos aqueles garanhões de cada subpopulação que possuem um índice de Proficiência (IP) de 2.00 ou mais até 2001. O IP é uma medida do desempenho do garanhão, incluindo um componente de ganhos e de produção em corridas de stakes. Menos de 200 reprodutores norte-americanos normalmente se qualificam com um IP de pelo menos 2.00. 

A Tabela 4 resume os resultados.

Entre os 49 garanhões RF, apenas um (2.0%), Quiet American, possui um IP de 2.0 ou mais. Isso contrasta com 8.7% dos garanhões não-RF. Embora possa parecer que a RF na genealogia de um reprodutor seja prejudicial ao desempenho reprodutivo, observamos mais uma vez, através do teste qui-quadrado, que a diferença não é estatisticamente significativa (valor de P 0.12, que é maior do que o valor P de 0.05 necessário para significância estatística). 

Conclusão: Este estudo confirma que o desempenho em corridas dos garanhões não está relacionado à presença de um RF em sua genealogia. O desempenho em reprodução parece igualmente não ser afetado. Em geral, os resultados corroboram os argumentos apresentados anteriormente por Roger Lyons e, mais importante, levantam sérias questões sobre a real validade do conceito de RF.





"Não tenho bases científicas para o nosso sistema e nenhuma explicação genética sobre os nossos cavalos e seus resultados. Mas ele funciona, pois produz consistentes resultados ao longo dos anos." Germaine Vuillier