quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Reynato Sodré Borges - Última carta



Dr. Reynato Sodré Borges. Foto cedida por José Laudo de Camargo.



Meu Caro amigo,

 

Volto ao assunto garanhões, aproveitando o resultado do GP Brasil 1979, ganho por APORÉ, secundado por SUNSET, que foi o ganhador do ano passado. O vencedor Aporé, realmente bom cavalo, de físico privilegiado, foi bem corrido  e gozou dos benefícios de não ter havido “cheval de jeu” ou “pace-maker” de outra coudelaria, que tivesse pretensões à vitória e assim, pode ele fazer um train de corrida a sua feição. Não, que tenha achado que 49” para os primeiros 800 metros (saindo do parado e quase todo em curva) tenha sido suave. Foi um train de cavalo bom, e, caso ele tivesse baixado para 48 ou 47 ¹/², seria a meu ver um train suicida. Para essa condição, é que se fazia necessário um “cheval de jeu” da coudelaria do Sunset, por exemplo. No entanto, havia no páreo o cavalo argentino Botón, ponteiro no seu estilo de correr, e, correu logo atrás de Aporé, na reta oposta, mas, jamais conseguiu pontear e nos últimos 1.000 metros, seu esforço foi maior ainda, mas, esmoreceu no final. Aporé estava “na ponta dos cascos”, muito bem preparado por Francisco Saraiva, que venceu seu primeiro GP Brasil. É claro que um “cheval de jeu” iria de qualquer modo para a ponta e ou forçaria o ponteiro de tal maneira (quebrando o seu ritmo), que ambos acabariam fora da competição. Juvenal Machado da Silva que também ainda não tinha vencido o GP Brasil, terminou em segundo no ano passado e foi à forra de Sunset, vencendo de ponta a ponta com Aporé, mais uma vitória (a sétima) da família Paula Machado. Uma tática inteligente dos Paula Machado, pois Amazon, ganhador do GP Dezesseis de Julho, era o preferido do jóquei principal da coudelaria, Gabriel Meneses, e os rivais correram por ele. Quando perceberam que o real inimigo era Aporé, que corria disparado na frente, já era tarde. Vitória maiúscula de Aporé pois derrotou entre outros Sunset, Big Lark, Artung, Mauser, Riadhis, Buvant, Topo e Maleval em mais uma vez um fortíssimo campo formado para a prova mais importante de nosso calendário. 

Utilizar táticas específicas para cada corrida é frequente na Europa, pois, o número de cavalos bons, nas grandes coudelarias, não é uma exceção. É muito raro, que prova de grupo em distância clássica (2.400 metros) seja ganha de ponta a ponta. Então, é óbvio, que os “cheval de jeu” são cavalos quase da mesma categoria que o titular. E o nosso turfe tem se beneficiado, comprando esses cavalos. Que aqui produziram bem e foram em campanha, auxiliares de outros da mesma coudelaria, tidos como melhores. Lembro por exemplo: Amphis, que corria para Philius; Cadir, que corria para Arbar; Dernah, que corria para Djedah; Violoncelle, que corria para Ocarina; Tang, que corria para Exbury e outros mais. Não há sentido de “pichação” no epíteto “cheval de jeu”, pois, caso não houvesse um ótimo cavalo que cuidasse dos “interesses do titular”, outro não seria o ganhador e assim, confirmando a alta classe. Violoncelle venceu o Prix de Saint Cloud em tempo magnífico, Cadir o Prix Morny, e Tang o Prix Jean Prat, todas provas de grupo 1...

Estou evitando o termo “faixa”, pois aqui é um auxiliar para prejudicar os outros, que possam ser adversários do “leão” do páreo, seja fechando, seja abrindo na curva, para entrar o titular, e outras “touradas”.

Lembro a você que no Derby francês de 1978, um “cheval de jeu” que ponteava, ao se esgotar, foi mal levantado e deu um tranco em ACAMAS, que praticamente o tirou do páreo, mas, deu margem a sua maravilhosa reação, que a crônica francesa cantou em prosa e verso. No inquérito, a comissão de corridas não deu uma punição violenta ao jóquei por não ter interferido no resultado dos 5 primeiros colocados. Levou 1 mês de suspensão nos hipódromos da região de Paris.

Quero lembrar a você, que  na 4ª carta (abril), estudei a linha materna de African Boy e para satisfação do critério “linha materna” em criação, ele ganhou a nossa tríplice coroa, além de vencedor de vários clássicos, e, quase todos, de ponta a ponta. Apesar da sua bela vitória no GP Cruzeiro do Sul, o Derby brasileiro, houve quem admitisse que African Boy foi corrido como “cheval de jeu” para Aporé, que vinha de boa vitória na Taça de Ouro. Acho possível, esta hipótese, mas, só a direção da coudelaria poderia confirmar ou não, e isso ela nunca fará. E claro, que este segredo será guardado e a meu ver, muito bem guardado (atitude hábil e louvável). Com a vitória no nosso St. Leger, que consagrou African Boy como tríplice coroado, confirmou ser um cavalo excepcional. Corre, fazendo um “train de luxo” (como se diz) e mantém no final uma ação rara de se ver.

Então vamos imaginar a necessidade de escolher um garanhão e selecionamos 3 opções que passaremos a analisar, AFRICAN BOY, APORÉ e SUNSET.

O primeiro é um tríplice-coroado, o segundo venceu o Brasil 79 e a Taça de Ouro e o terceiro ganhou o Brasil 78, em tempo recorde, e recebeu o título de “Rei da Raia Paulista” de 1979, além de ter sido segundo para Aporé no Brasil 79.

Então, meu bom amigo, imagine-se comprador de 1 desses 3 cavalos. Qual escolher?

As campanhas são todas demonstrativas de alta qualidade, e, podemos considera-las como semelhantes. Quanto ao físico, há grandes diferenças. African Boy é um cavalo equilibrado, elegante, cabeça árabe, pescoço de cisne, distingue como diriam os nossos irmãos mais velhos, os gaulêses.  Aporé, já é um cavalo de tipo “rústico”, robusto, poderoso, uma cópia fiel de seu pai EGOISMO, impõe-se pela potência que aparenta. Sunset, também um bonito cavalo, mas bem mais frágil (final da criação em Lorena).

Quanto ao pedigree, só APORÉ tem seu pai nascido no Brasil, que é o excelente já citado Egoismo (ganhador do Derby Paulista e dos Criterium do Rio e de São Paulo), filho do bom cavalo italiano Alberigo, na clássica Urgência, lamentavelmente, por falecer precocemente, deixou só 3 pequenas gerações no Haras Mondesir. Luzón, mãe de Aporé, pertence a linha da ROSE OF ENGLAND, ganhadora do Oaks e de sua filha FAERIE QUEENE vêm My Ladyship, a quarta mãe de Aporé e de Tibetano. Galloway Queen, irmã materna de My Ladyship, com WORDEN produziu Fallow, que importada pelos argentinos, produziu notáveis éguas, entre elas FARM e FIZZ. Concluindo, Aporé tem bom tipo, boa campanha, bom pai e boa linha materna. Tudo o que é necessário para se esperar um garanhão de futuro sucesso.

Agora, vou estudar o SUNSET, pai importado, WALDMEISTER, com vitórias em provas de grupo, em distância de fundo (naturalmente), com linha materna magnífica (TERESINA), e eu o considero garanhão da seleção atual do nosso turfe. Sua mãe, LÁ, é filha da notável NUVEM com MÂT DE COCAGNE. Não preciso lembrar a você, os irmãos de LÁ (TIMÃO, ZUIDO, DIESE, XIMBAÚVA e GAJÃO) e nem o que eles fizeram nas pistas. Esta linha materna também possui LONDRINA (que foi gêmea) e irmã inteira de Nuvem, isto é, KING SALMON e COLITA, que foi ótima égua nas pistas. Então, o Sunset tem bom físico, apesar de um pouco frágil (mas, isto não se transmite, caso a criação seja de bom nível), tem boa campanha e tem ótima linha materna sul-americana.

Agora, passemos ao AFRICAN BOY, que tem bom físico, pai importado FELICIO com vitórias em importantes provas de grupo, de notável linha materna (PRETTY POLLY) e já ocupando lugar na nossa seleção de garanhões. Sua mãe LISELOTTE, ganhadora clássica, tembém pertence a notável linha materna, a da CONCERTINA (St. Simon x Comic Song), que deu GARREN LASS e PLUCKY LIEGE, de onde saiu um elevado número de cavalos e éguas da melhor qualidade: Marguerite de Valois, Admiral Drake, Sir Gallahad, Bois Roussel, Bahram, Dastur, The Phoenix, Sunny Boy, Rajput Princess e sua filha Regal Exception, Manacor, Niloufer etc...

Estou acompanhando seu pasmo, quando diz: e o conselho de não ter garanhão residente e começar comprando cobertura! Certo que sim, e, esta é uma boa conduta, mas, dentro de um certo prazo e diante de fatos que ocorrerão, você vai sentir a necessidade de comprar um garanhão. E assim, aproveitei esta notável ocorrência em setembro de 1979 existirem 3 cavalos em condições de aproveitamento, na criação e, os coloquei como exemplos. É claro, que pediremos novamente influência de “Papai Noel” e com ela, vou me atrever a avalia-los, pois o nosso amado “Noel” o permitiu, achando que eles podem ser postos a venda.

Qual o melhor, pergunto? Difícil responder, pois todos são muito prendados. Parece-me que o mais caro seria AFRICAN BOY, o tríplice coroado, pois como entre os homens, o privilégio é muito ambicionado. E também, que a linha materna dele seja a que mais impressiona e sem dúvida, ela tem e terá sempre valor na Europa. Estimo que ele possa ser vendido por Cr$ 6.000.000,00 (seis milhões de cruzeiros), algo equivalente a U$ 200.000 (duzentos mil dólares).

SUNSET, que gosto muito, eu estimo em Cr$ 3.000.000,00 (três milhões de cruzeiros) e o APORÉ de pai nacional e mãe também nacional, o que também em parte ocorre com Sunset, pois sua mãe LÁ é nacional, cairia para algo como Cr$ 2.000.000,00. E nesses 2 casos, lembro-me do Nelson Rodrigues quando diz: que o subdesenvolvido não tem autoestima...

Já possui o meu bom amigo, nesse lindo sonho, 3 cavalos de ótima categoria, para dentre eles escolher aquele que será o pastor chefe do seu haras. Já terás o box para o garanhão, a maternidade e entre os dois o laboratório e residência de um empregado de categoria. Escolhido pelo gerente. Terá também 2 piquetes, onde ficarão as éguas próximas da cobertura, precedidas ou não da parição.

A condição ideal é não sindicalizar o garanhão. Ele será seu, e, venderá coberturas a quem desejar, exigindo éguas de boa qualidade.

Não suponha que o garanhão tenha obrigatoriamente que cobrir 40 éguas por estação de monta. Esse número, é o máximo que se lhe pode (ou deve) dar em éguas e para tanto, ele dará entre 100 e 140 saltos, em um haras bem orientado (sem cobertura dirigida, pelo palpar retal).

Aproveite a oportunidade, para ir contra o conceito de mais de duas coberturas por dia, o que leva o garanhão a entrar em fadiga sexual no último terço da estação de monta. Isto pode ocorrer (2 saltos diários), mas, não deve ser considerado como atitude rotineira e quando tiver que ser  praticado deverá ser com intervalo mínimo de 6 horas. Observou-se que após a segunda ejaculação, num intervalo mínimo de uma hora, a concentração total de espermatozoides no ejaculado cai em 43% já no terceiro ejaculado.

Durante o período reprodutivo, o garanhão é exigido diariamente, e suas características de comportamento e espermáticas devem corresponder à sua libido e taxa de fertilidade, sendo esta obtida através de exame específico na semana anterior ao início da estação de monta. O volume e a concentração no ejaculado dos garanhões estão diretamente relacionados ao tamanho (massa) testicular, que reflete a dimensão e o comprimento dos túbulos, e consequente eficiência de produção espermática.  Entretanto, a utilização de garanhões submetidos a regime intensivo de ejaculação exige maior controle quanto a sua capacidade reprodutiva e para alguns machos o tempo de reação é muito prolongado, exemplo de TANG (pai do derby-winner ARNALDO) que não apresentava interesse em mais de um serviço por dia.

Não se deve esquecer que o manejo ineficiente das éguas pode vir a ser um importante complicador da taxa de fertilidade.

Voltando a escolha entre os 3 garanhões oferecidos por Papai Noel. Consultado o livro de pedigrees das tuas éguas, você vai se lembrar que possui 3 éguas, filhas de Waldmeister e 3 filhas de Felicio !! E boas éguas, quanto a linha materna e por isso, vai escolher o APORÉ que tem um pedigree aberto para todo o seu plantel.

Procure meu bom amigo, acreditar no bom cavalo nacional, como garanhão. Não pode ser qualquer um, mas, um ganhador de um dos nossos 2 Derbys – Cruzeiro do Sul e Derby Paulista ou de provas de Gr.1. Particularmente considero o nosso Grand Criterium - GP Linneo de Paula Machado, Gr.1, em 2000 metros, como uma prova extremamente seletiva e cujos vencedores devem ser analisados com o mesmo cuidado que se olha os vencedores de nossos derbys. Os vencedores de grupos 1 brasileiros são merecedores de estudos e devem ser aproveitados. Os garanhões que têm sido importados são fracos, e, todos com campanhas locais inferiores aos 3 cavalos já citados e mais as de AGENTE – DAIÃO - TONKA - TIBETANO – TUCUNARÉ - FRIZLI – ARNALDO – LUCARNO - FITZ EMILIUS – EARP – BIG LARK - DARK BROWN e ORPHEUS entre inúmeros outros. E sempre que possível, escolha preferencialmente cavalos ganhadores dos 2.000 aos 2.400 metros.

O que aconselho, é que ao bom cavalo nacional sejam dadas éguas europeias (irlandesas principalmente, pois são as que ainda são de preço acessível) ou argentinas descendentes das famílias maternas elite que se formaram naquele país. É necessário sempre reforçar o plantel nacional, isto é, trazer elementos de origem, para manter o bom status genético de uma raça, que ainda está em evolução.

Você deve sempre tomar minhas posições não como dogmas e sim como pontos de partida para que através de seus estudos possa auferir conhecimentos e daí as avalizar ou mesmo as questionar. Mas, jamais se deixe levar pelo achismo, que é a filosofia que norteia a imensa maioria dos "proprietários de haras" da atualidade, note bem que não escrevi "criadores", esses de fato são raros e sua contagem cabe nos dedos de uma mão. 

Infelizmente grande parte de nossos haras são propriedade de endinheirados ignorantes das questões do PSI que não gostam de ouvir expertos em pedigrees e cruzamentos, treinadores, veterinários, ferrageadores e por consequência, de forma arrogante, sempre acham que sabem o que não sabem.

Fique com essa frase: "o pouco que sabemos só serve para nos dar noção do quanto desconhecemos."

Consequentemente o único caminho a ser trilhado é o do estudo, estudo e mais estudo!


Reynato Sodré Borges

Rio de Janeiro – setembro – 1979.

 


Dr. Reynato veio a falecer em outubro de 1979 e essa a última carta recebida. Além de ser uma das maiores autoridades em PSI que o Brasil já conheceu, foi dos mais conceituados oncologistas de sua época. Cofundador do Centro de Tumores Reynato Sodré Borges, em Blumenau, ainda hoje referência para tratamento da doença em Santa Catarina. 

Gratidão pelo privilégio dos anos usufruídos em sua convivência.


Ricardo Imbassahy






 



 


sábado, 9 de dezembro de 2023

Os "japoneses" - French Deputy

 




French Deputy, 6-4-1-0, nasceu em 1992, criação e propriedade do milionário casal filantropo Marjorie e Irving Cowan. Estreou aos 2 anos em 1200 metros, dirt e venceu por 5 corpos, essa foi sua única apresentação nessa idade.

Aos 3 anos abriu campanha no Santa Anita Park em uma prova de 1300 metros no dirt, venceu por 2 1/2 corpos. Sua terceira apresentação foi em 1600 metros, dirt, Santa Anita Park e venceu por 11 corpos.

French Deputy se lesionou em treinamento e foi obrigado a fazer uma longa pausa, não podendo competir no Kentucky Derby, ao qual havia se credenciado como o mais gabaritado representante da costa oeste. Somente no outono de seu terceiro ano French Deputy pode retornar a atividade, tendo em vista a Breeder's Cup Classic. Foi inscrito no Jerome Handicap (G2, D,1600m) e derrotou por 4 corpos Top Account (G2), Reality Road (G2), Suave Prospect (G3) e Mr. Greeley (G3)

Continuando sua preparação para a BC Classic foi apresentado em um Allowance, 1600m, dirt. Mas seu jóquei perdeu o chicote na entrada da reta e French Deputy acabou obtendo uma segunda colocação, após duro final contra Top Account e Reality Road. Sua última corrida foi na BC Classic (G1, D, 2000m) onde sentiu antiga lesão e entrou descolocado, sendo destinado a reprodução.

Iniciou-se como garanhão na Three Chimneys Farm, Kentucky, e após 4 temporadas de monta foi vendido para o Japão. 

Entre EUA, Japão, Austrália, Argentina e Singapura produziu 32 GSW's e é pai de Kurofune (G1) - JRHA Stallion of Merit, que produziu 25 filhos GSW's e 27 netos GSW's. Kurofune infelizmente não deixou nenhum filho como garanhão, mas, também, repete o êxito de seu pai como avô materno. Neste momento encontra-se na terceira colocação na estatística geral japonesa, também foi 3º colocado em 2019-2020-2021 e 2022, perdendo os dois primeiros postos  ora para King Kamehameha, ora para Sunday Silence ou Deep Impact.


Kurofone


French Deputy manteve sua genética em alta hierarquia por meio de suas filhas e se firmou como um dos mais importantes avôs maternos do turfe japonês, com 40 netos vencedores de GSW's. French Deputy foi 2º colocado na estatísticas gerais japonesas de broodmare sires em 2016-2017-2018 e 3º em 2015. 

É também avô materno de importante sucesso nos EUA e Argentina, tendo além, netos GSW's na Inglaterra, Austrália e Nova Zelândia. Dentre eles destacamos os vencedores de G1 Hi Happy (Man O'War S-EUA), Undrafted (Diamond Jubilee S-GB), Marche Lorraine (Breeder's Cup-EUA), Majestic Harbor (Gold Cup at Santa Anita S-EUA), Visionaire (King's Bishop S-EUA), Danza (Arkansas Derby-EUA), Hispanidad (Polla de Potrancas-Arg) e Hinz (2000 Guineas-Arg).

French Deputy foi eleito JRHA Stallion of Merit.




Obs.: Fomos alertados por José Laudo de Camargo que French Deputy não serviu em regime de shuttling na Argentina e sim que as éguas eram servidas em temporada sul-americana nos EUA e seguiam para a Argentina. Apesar de nossos estudos serem baseados em recordações do passado e fontes sérias, é perfeitamente natural que aconteça algum equívoco dessas fontes e mesmo alguma falha de memória. Checamos o alerta de Zé Laudo junto ao studbook argentino e confirmamos sua informação, portanto, a bem do correto, foi corrigido o texto original do artigo.















sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Varola - Análise de tendências - 7ª parte





Lydia e Frederico Tesio.




(continuação)


A aplicação dos 50 nomes de garanhões chefes-de-raça às dosagens atualizadas dos animais clássicos perminitiu-nos verificar que, em média, um pedigree contém de 20 a 25 nomes de chefes-de-raça e que a sua distribuição ideal seria um diagrama de tipo 5-5-5-5-5 ou 4-4-4-4-4, indicativo de equilíbrio e de uma pluralidade de influências genéticas no próprio pedigree. Entretanto, este equilíbrio raramente é alcançado na prática e, em certos casos o número de 50 chefes-de-raça escolhidos para a dosagem não é suficiente para fornecer une retrato autêntico do indivíduo examinada, razão pela qual é necessário escolher outros nomes para completar o valor da unidade de medida usada.

Estes nomes acrescentados podem ser obtidas simplesmente juntando-se garanhões mais recentes à lista original, mas, mesmo assim, a dosagem não poderia ser calculada com equidade nos casos em que as fundamentais influências passadas não sejam oportunamente tomadas em consideração; consequentemente, a ampliação da lista deverá ser obtida em duas partes uma que compreenderá garanhões do passado que, por razões diversas, não foram integrados à lista original e outra que compreendera garanhões recentes ou, pelo menos, nascidos depois de 1940. O primeiro grupo em acréscimo compreenderá vinte e cinco nomes, dez dos quais serão dos assim chamados "pais de reprodutoras", um tipo que não foi considerado na lista original. O segundo grupo em acréscimo compreenderá também vinte e cinco nomes. Os acréscimos compreenderão, portanto, um total de cinquenta nomes que, adicionados aos  cinquenta chefes-de-raça originais, formarão um total geral de exatamente cem nomes, um limite além do qual a pesquisa se tornaria demasiadamente complexa. Por outro lado, o  desenvolvimento quantitativo das corridas e da criação no mundo, nos últimas vinte anos, foi de tal vulto que mesmo cinquenta nomes a acrescentar não serão muito difíceis de ser encontrados, porquanto devem abranger, com as devidas proporções, todos os países em que a criação foi suficientemente desenvolvida, de forma que a dosagem possa ser estudada sobre os pedigrees de qualquer proveniência. Quanto mais se amplia o campo da pesquisa » mais se encontram garanhões com credenciais quase idênticas. Minhas escolhas obedecem, por essa razão, e em vários casos, as diveras alternativas disponíveis.

Para exemplificar o problema de calcular a dosagem dos pedigrees com equidade, tomemos ao acaso Armistice, 1959, vencedor do Grand Príx de Paris. Ele tem quatro correntes de Phalaris, urna das quais através de Fairway, totalizando assim cinco pontos na seção brilhante, enquanto as presenÇas de outros chefes-de-raça são 14 (Rabelais, Blandford, Swynford, Solario, Gainborough, Bayardo 2x, Teddy, Son-in-Law, Dark Ronald, La Farina, Chaucer 2x e Sunstar) com um índice de consistência de 14.5 = 2,8, que parece insuficiente para caracterizar seu tipo. Porém, se concedêssemos pontos ulteriores a seu pai Worden, a seu avô WiId Risk, a seu avô materno Vandale e entre seus outros antecessores, a Bruleur e Sardanapale, todos nomes muito importantes, alcançaríamos urna proporção de 5 a 19, com um índice de consistência de 3,8, que estaria evidentemente mais próximo da realidade.

Este ajuste do índice por meio do uso de nomes adicionais torna-se necessário também a todos os pedigrees que contêm o nome de Tourbillon. Este é o único garanhão de sua linha compreendido entre os 50 garanhões chefes-de-raça originais, enquanto as outras linhas contam com três ou quatro nomes consecutivos (ex.: Phalaris Pharos - Nearco - Nasrullah, ou Swynford - Blandford - Bienheim),com o resultado de que pedigrees fortemente baseados em Tourbillon, que são encontrados com frequência, especialmente na França, não são facilmente interpretáveis em termos de dosagem, porquanto o próprio Tourbillon compreende o nome de um único outro reprodutor da série original (Rabelais) em seu pedigree razão pela qual um cavalo inbreed sobre Tourbillon possui apenas quatro nomes elegíveis, que não são suficientes para caracterizar um inbreeding deste tipo.

Esta estirpe não é somente básica da criação francesa, mas adquiriu prestígio mundial, razão pela qual será preciso encontrar nomes adicionais para individualizá-la claramente. Um destes nomes será, naturalmente, Djebel, que em termos genealógicos é o mais importante e o mais geograficamente difundido de todos os filhos de Tourbillon, um outro nome nome deverá ser escolhido entre o pai de Tourbillon, Ksar, e o avô, Bruleur. Não só Bruleur compreende uma porção mais ampla de população equina do que Ksar, mas é também o mais importante dos dois em termos absolutos; com  efeito, pode-se afirmar que Bruleur seria, históricamente, um reprodutor importante, ainda que Ksar jamais tivesse existido, enquanto é improvável que Ksar fosse hoje um elemento importante não fosse por Tourbilion. Existe porém uma marcante diferença entre Bruleur, Tourbillon e DjebeI: o primeiro pode ser considerado um fator de reforço no        pedigree, e, portanto, deverá ser classificado entre os robustos, enquanto Tourbillon pertence ao grupo clássico e Djebel, por sua vez, deverá ser colocado no grupo dos intermediários, embora também fosse apropriada sua classificação entre os brilhantes.

Traduzindo em termos práticos o que foi dito acima, o pedigree do garanhão Hugh Lupus teria, com a lista restrita, apenas seis nomes elegíveis (Tourbilion 2x, Rabelais 2x, Bayardo, Teddy), enquanto uma lista ampliada eleva estes nomes a 10 (mais Bruleur 2x e Djebel), fornecendo assim um quadro mais completo e especialmente util quando se compara a dosagem da reprodutora a ser enviada à cobertura com o garanhão.

Ajustes análogos serão necessários no que diz respeito aos vários ramos de St. Simon, que voltaram ao auge nos últimos anos. Só o de Chaucer estava bem representado na lista original, com o próprio Chaucer, Vatout e Bois Roussel e, no máximo, poder-se-á acrescentar Vatellor, cuja inclusão, aliás, me foi solicitada por vários correspondentes, mas é importante reexaminar os três ramos de Rabelais, Persimmon e Florizel lI.

Rabelais é também representado por Havresac II, mas a extraordinária sequência que tem origem neste ultimo dá motivo a que não se possa ignorar Tenerani e Ribot, e também Traghetto, que foi o mais importante expoente de Cavaliere d'Arpino na raça. Além disso, o ramo de Rabelais para Rialto também deve ser considerado por mérito de Wild Risk e Worden. A linhagem de Persimmon, era representada na origem por Prince Rose, mas os descendentes de Prince Rose estabeleceram um domínio clássico tão forte nos últimos anos que deverão ser incluídos na lista e é difícil escolher entre Prince Chevalier, Prince Bio, Sicambre e Princequillo, que possuem credenciais impressionantes na Inglaterra, França, Estados Unidos e alhures.

A linha de FlorizeI II só é importante em função de Massine e de seu filho Mieuxcé, mas em um panorama global de 100 garanhões nem um nem outro pode ser ignorado. Massine é um poderoso fator de robustez na criação francesa, enquanto Mieuxcé alcançou uma posiçao de proeminência através de suas filhas. Surge aqui o problema dos "pais de reprodutoras", que não foram considerados na lista original. Garanhões como Bachelor's Double e Clarissimus adquiriram fama eterna exclusivamente através do êxito de suas filhas e é extraordinário que suas influências positivas nos pedigrees sejam ainda sentidas, porquanto remontam, respectivamente, a cerca de sessenta e cinquenta anos atrás. Entretanto, no pedigree do "derby-winner" italiano Braccio da Montone o nome de Clarissimus surge, não além da terceira geração, como pai da avó do vencedor Bayuk. Na América do Norte há vários nomes de pais de reprodutoras a serem considerados seriamente, dos quais os mais ilustres são Sir Gallahad III, War Admiral e Mahmoud.

Além disso, não se pode desprezar Navarro, que, como pai de reprodutoras, só cede o primeiro lugar a Ortello no turfe italiano contemporâneo a talvez como índice qualitativo é mesmo superior ao próprio Ortello. Com exceção de Bachelor's Double, que eu colocaria no grupo dos robustos, sou levado a classificar todos os outros no grupo clássico, pela absoluta excelência de sua contribuição genealógica.

Incidentalmente, apresentam-se duas interessantes observações. Uma é que os garanhões norte-americanos, que muito raramente são elegíveis para o grupo clássico como pais de vencedores, são, ao contrário, representados "ad abundantiam" no mesmo grupo clássico como pais de reprodutoras. Esta com efeito, é uma das peculiaridades das estatísticas norte-americanas. Sua lista de pais de vencedores lamentavelmente é condicionada a distância média de suas corridas, mais a lista de pais de reprodutoras da lugar nas primeiras posições apenas aos cavalos de primeirissimo plano e de indubitável qualidade clássica. A segunda observação é que, ao contrário, os garanhões francêses, que se  sobressaíram como pais de grandes vencedores nestes ultimos anos, não parecem contar com nenhum expoente importante entre os pais de reprodutoras, com exceção de Sardanapale e Massine, que, porém, pertencem ao passado, e de Mieuxcé, que, todavia emergiu nesta especialidade na  Inglaterra. lsto não implica em que sejam menos eficientes do que outros neste setor particular, mas antes que seu êxito como pais de vencedores foi de tal forma grande que não têm necessidade de ser qualificados especificamente como pais de reprodutoras.

O setor pais de reprodutoras não estaria completo sem Foxbridge, fator básico do desenvolvimento na criação da Austrália e da Nova Zelândia, cuja presença permitirá uma leitura mais cuidadosa dos pedigrees daquela parte do mundo. Da mesma forma, o já lembrado Sardanapale deverá ser incluído em consequência de sua presença intensiva e constante nos pedigrees clássicos, não obstante o transcurso de mais de cinquenta aros de seu nascimento. SardanapaIe pertence a uma linha excêntrica, que de outra forma não seria representada na lista, e seu único produto de grande valor  nas pistas foi Apelle, que, por sua vez, se tornou um nome obrigatório através de Tofanella e dos descendentes desta, Tenerani e Ribot. A influência de Apelle, que foi considerado um cavalo de grande robustez, capaz de suportar qualquer "training", é nitidamente perceptível na síndroma de seus      descendentes, através das grandes reprodutoras Tofanella, Tokamura e Trevisane, mas, além disso, Sardanapale aparece frequentemcnte nas seções inferiores dos pedligrees franceses.

Entre os cavalos do passado que conferem mérito particular a um pedigree e que agora devo levar em conta afim de preencher as lacunas da seleção original, já mencionei Djebel e Bruleur e agora devo examinar Sir Cosmo, Colorado, Equipoise e Man O'War, todos nascidos antes de 1930. Sir Cosmo demonstrou saber exercer uma influência muito mais profunda do que se poderia deduzir de sua sindroma exclusivamente brilhante e aparece frequentemente na seção inferior de muitos indivíduos importantes recentes, sem contar que é avô materno do ex-campeão mundial de somas ganhas, Round Table, por sua vez reprodutor de futuro. Além disso, vale para Sir Cosmo, ao contrario, o que foi dito a respeito de Tourbillon e Bruleur no caso de Armistice, ou seja, quando examinamos um pedigree de um velocista inglês desta linha dispomos apenas do nome de Panorama como contribuição para um índice de consistência realístico, mas o acréscimo de Sir Cosmo no setor brilhante permite naturalmente uma avaliação melhor. Pode-se, portanto, afirmar  que em um pedigree tendencialmente de velocidade pura, a presença de Sir Cosmo equilibra a dosagem, enquanto em um pedigree tendencialmente clássico ou robusto, sua presença fornece aquela pitada de brio que é sempre indispensável e desejável.

Colorado foi rapidamente esquecido em sua época porque não chegou sequer a completar sua segunda temporada de monta; entretanto, nenhum reprodutor jamais foi capaz de gerar tantos cavalas qualitativos e importantes em um período de tempo tão restrito. Todos os seus filhos e filhas voltaram agora ao cenário, especialmente nas seções inferiores dos pedigrees ingleses, com possibilidades de ulterior  desenvolvimento em vários países europeus e americanos. Quanto a Man O'War, ele se tornou em fator por assim dizer obrigatório nos pedigrees dos Estudos Unidos e nem deveria ser preciso comentá-lo, mas poder-se-ia objetar que sua linha já é suficientemente representada por seu pai Fair Play, membro do grupo originário, e por seu melhor filho, War Admiral, ora eleito entre os pais de reprodutoras. Porém, a importancia desta linha cresce com os anos em lugar de diminuir, razão pela qual creio que a inclusão dos três nomes é justa. Entre os produtos importantes nascidos depois de 1930 e antes de 1940, merecem menção especial Brantôme e Bahram, ambos filhos de Blandford e cavalos de corrida de primeiríssima ordem. Sua avaliação exata foi impossível antes de agora, porquanto Bahram funcionou em vários países com sucessos alternados e Brantôme também foi transferido durante a guerra, razão pela qual não se lhe deu grande    importancia até uma época muito recente, havendo aliás a tendência de considerá-los genealogicamente modestos, mas com o passar dos anos a situação modificou-se completamente. Aprecia-se hoje em seu justo valor o trio deixado por Bahram na Europa: Persian Gulf, Turkhan e Big Game, para não falar em outros bons elementos além-mar, enquanto Brantôme, além do êxito de suas filhas na reprodução reprodutoras, estabeleceu através de Vieux Manoir uma fonte aparentemente inesgotável de vencedores clássicos.

Acrescentando aos nomes propostas o anglo-americano  Heliópolis e o anglo-argentino British Empire no setor          brilhante, o anglo-argentino Full Sail e os norte-americanos Eight Thirty e Roman no setor intermediário e o norte-americano Alibhai no setor clássico, temos os 25 nomes adicionais do passado que nos seriam uteis. Futuramente, será útil ver quais poderiam ser os 25 nomes recentes. ou sejam, nascidos depois de 1940, necessários para completar a lista final dos cem garanhões mais importantes do século.


                                           Fim


Franco Varola


Tradução: Ricardo Imbassahy






sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Reynato Sodré Borges - 10ª carta

 




Hyperio, o maior craque da criação Julio Cápua e considerado por Dr. Reynato como possuidor da construção de pedigree mais refinada da criação brasileira.




Meu Caro amigo,

 

Ainda sobre o garanhão. Deixei claro, que no início, você não deve ter garanhão e sim, comprar coberturas dos garanhões existentes na região.

Para transportar a égua  mesmo com cria ao pé, para os haras vizinhos, adquira uma carreta apropriada para o transporte de 2 equinos, que pode ser puxada por um utilitário. A égua deverá sempre ser acompanhada pelo cavalariço e do gerente do haras, para que o mesmo constate todas as condições do serviço e se o garanhão contratado é o mesmo que irá servir a tua égua. Não podemos esquecer que vivemos em um turfe de segundo mundo e até um erro como esse pode acontecer.

Evite de ter sua égua hospedada em haras onde estiver estacionado o garanhão que vai cobri-la. A égua sente a mudança de ambiente, de ração, enfim, do trato. Isto deve ser feito, no caso do garanhão estar estacionado no Posto de Monta ou em haras afastado do seu. Neste caso, a égua deve ser enviada com antecedência para se adaptar a nova situação.

Quanto a utilização ou não de inbreedings digo que tudo depende do que o estudo específico de cada cruzamento lhe dirá e da filosofia de criação. Os Seabra, por exemplo, durante seu período áureo, só criavam animais outcross e o Haras Mondesir também. O Haras Faxina vai além e busca mais ainda a abertura de pedigrees usando garanhões norte-americanos (EARLDOM e DADDY R) sobre éguas de matriz europeia e argentina. Mesmo que Daddy R não tenha confirmado as expectativas, Earldom transformou-se em um dos garanhões de maior êxito na história da criação nacional. Os barões Von Leithner também seguiram o mesmo pensamento em seu Haras São Bernardo e importaram o norte-americano PASS THE WORD, para servir suas éguas, que em maioria respondem pela combinação das genéticas Rothschild e Boussac, obtendo assim extraordinário resultado. Esse mesmo sucesso com animais outcross o Haras Rosa do Sul está conseguindo com o também norte-americano TUMBLE LARK sobre éguas argentinas, os exemplos são BIG LARK e DARK BROWN.

Os Paula Machado também só criam animais outcross e têm como maior ênfase na sua criação a combinação de linhagens convergentes, como já lhe disse anteriormente. Na Europa a criação Aga Khan também só cria animais outcross. É indiscutível que os produtos outcross de forma predominante possuem mais saúde e vigor físico que os animais provenientes de inbreeding.

Mas o inbreeding bem utilizado é extremamente válido e me recordo de HYPERIO, um dos melhores cavalos de sua geração, um filho de Amphis em Zabaglione. Ele possui um inbreeding 3x3 sobre o chef-de-race PHAROS através de seus 2 melhores filhos, os também chefs-de-race PHARIS e NEARCO. E Hyperio ainda possui os chefs-de-race TOURBILLON e HYPERION, como pais de suas avós! Pois é, conforme comentei anteriormente sobre o imediato sucesso do Haras Vale da Boa Esperança era esse o nível de qualidade da genética que Júlio Cápua tinha em seu pequeno e modelar haras em Petrópolis.

O grande craque brasileiro ZENABRE é um 3x3x5 também sobre PHAROS. Zenabre era muito manso e sempre padeceu consequências de problemas ocasionados por seus joelhos; ao contrário de Hyperio, que era extremamente temperamental mas muito saudável, e só foi retirado das pistas quando o problema ocasionado por acidente de carreira, no início dos 3 anos e que custou sua invencibilidade, se agravou no final dos 4 anos.

O que temos? Ambos extraordinários indivíduos com inbreeding sobre PHAROS e com temperamentos e questões de saúde totalmente diferentes. Consequentemente, ao pensarmos em inbreeding , temos que considerar o perfil dos descendentes daquele indivíduo ao qual objetivamos a consanguinidade.

No caso de Zenabre o que podemos observar que seu avô materno SEVENTH WONDER (por Pharos), 3º nos 1000 metros do Norfolk Stakes correu apenas 10 vezes por ter mancado de joelho. Seu pai, o notável garanhão PHARAS (por Pharis - Pharos) correu apenas duas vezes e venceu ambas, sendo uma delas o Prix du Lys, G3 em 2400 metros, foi retirado prematuramente das pistas por problemas físicos. Pharos se notabilizou por além da alta classe transmitir problemas de joelhos. Tal somatório não interferiu na altíssima classe de Zenabre, mas, evidentemente influenciaram na trajetória de sua campanha.

Resumindo, ambos eram inbreeding em Pharos, mas Hyperio o era através de 2 veios saudáveis - Amphis e Nearco (3x3) - e Zenabre através de 2 veios não saudáveis - Pharas e Seventh Wonder (3x3) - e 1 saudável na quinta geração, Rhodes Scholar.

É evidente que não existe uma fórmula mágica que nos ofereça a certeza para a obtenção do grande craque ou mesmo um bom cavalo, lembre-se que a criação do PSI é um jogo de xadrez contra a natureza. Mas, o nosso papel  é minimizar o tremendo handicap que a natureza tem contra nós e procurar seguir os caminhos que nossos estudos nos indicam.

Vamos rememorar juntos, a notável égua EMERALD HILL (Locris x Embuia), sem dúvida do que de melhor se tem criado no turfe brasileiro e que já passou para a galeria das grandes éguas do nosso turfe: JOIOSA – DULCE – GARBOSA BRULEUR -  PLATINA – ELAMIUR - JACUTINGA - DONÉTICA e FONTAINE. A sua mãe Embuia, resultou do acasalamento de Emócion com Sunny Boy, um bom stayer francês e que pertence a família 16-a, a de CONCERTINA, uma das 10 melhores linhas maternas do mundo, mãe de PLUCKY LIEGE (mãe de BOIS ROUSSEL, ADMIRAL DRAKE e SIR GALLAHAD) e avó materna de FRIAR’S DAUGHTER (mãe de BAHRAM e DASTUR). Linha materna dos nossos conhecidos MANACOR (Corpora e Mallorca) e do tríplice coroado AFRICAN BOY(Felicio e Liselotte). Veja só a qualidade das éguas importadas por nossos criadores, o que garantirá para o futuro a existência de ótimas famílias maternas adaptadas ao nosso meio, aos moldes do que fazem os criadores argentinos. Note que African Boy vem por Niloufer e Manacor por Fille de Salut, veios distintos de FRIAR’S DAUGHTER. Essa genética materna de ponta do turfe mundial, deve ser preservada como um tesouro através do aproveitamento na reprodução das filhas de LISELOTTE e MALLORCA. 

Só espero que as novas gerações de criadores, que já se mostram em adiantado processo de aculturamento norte-americano, não ponham a perder genéticas europeias e argentinas trazidas a peso de ouro pelos Seabra, Paula Machado, Peixoto de Castro, barão e baronesa Von Leithner, Henrique de Toledo Lara, Mariano Raggio e alguns outros criadores com elevado senso técnico. 

Isso não quer dizer que as raras combinações genéticas de qualidade existentes nos EUA devam ser ignoradas por nossos criadores. O sucesso de Earldom, Pass The Word e Tumble Lark assim o comprovam. 

Embuia foi o primeiro produto de Emócion e lembro-me bem, que quando soube que voltara prenha da Europa por um stayer (mas que havia vencido a estatística francesa), confesso que não gostei, isto é, eu não teria escolhido Sunny Boy. Mas, para cobertura de nascimento sul-americano, não é fácil obtê-la dos garanhões desejados, mesmo com disponibilidade financeira para tal, e, conseguir do Sunny Boy para este período, já fora muito difícil conforme me disse Roberto e que o objetivo para esse cruzamento era, com sorte, conseguir uma fêmea para ser incorporada futuramente ao seu plantel de reprodutoras. Nasceu Embuia e daí EMERALD HILL...

Criação do PSI meu bom amigo é, antes de tudo, possuir conhecimento da raça para planejar corretamente e ter visão do futuro!

Quanto a essas questões de cruzamentos e aptidões funcionais, aconselho a que preste muita atenção a tudo que Franco Varola diz em nossas reuniões!  Estudar o seu livro “Typology of the Racehorse” é fundamental para que você amplie seu entendimento sobre transmissão da herança aptitudinal no PSI.

Franco comentou em nossa última reunião na cocheira Rocha Faria, à qual você faltou, que está finalizado o seu próximo livro, uma continuação e complementação com novas ideias do primeiro. Mas como não encontrou patrocínio do JCB e JCSP para publicação de 500 exemplares comemorativos, à qual abriria mão de seus direitos para essa tiragem em português, desde que o mesmo fosse vendido a preço de custo por essas entidades, o está enviando para a JA Allen, editora de seu primeiro livro.

Estou sempre receoso de ter sido pouco claro nessas cartas. Mande-me uma palavra sobre isto.

O que me tranquiliza é que posso em outros colóquios, voltar a certos pontos (o que já tem acontecido por mais de uma vez) e levar uma palavra ou exemplo, que venha preencher algum claro deixado.

Que o amor pela criação continue desperto em você e que reconheça que ela é Divina e nos cabe somente dar as melhores condições para que ela se realize, interferindo o menos possível.

 

Reynato Sodré Borges

Tebas - agosto - 1979








sábado, 18 de novembro de 2023

Os "japoneses" - Brian's Time

 




Brian's Time, 21-5-2-6, nascido em 1985, foi um múltiplo vencedor de Grupo 1 nos EUA, criado na Darby Dan Farm defendeu nas pistas as cores de seus criadores, James e Jody Phillips. Brian's Time obteve 5 vitórias em 21 partidas, venceu o Florida Derby sobre Forty Niner, Pegasus Handicap  e Jim Dandy Stakes. Terminou em segundo lugar no Preakness Stakes e terceiro no Belmont Stakes e Travers Stakes.

Era filho de Roberto em Kelley's Day por Graustark, e tinha em sua geração de haras Sunshine Forever, seu irmão paterno que também defendia as cores de James e Jody Phillips. Ele e Sunshine Forever, que possuía campanha superior estavam programados para entrarem como garanhões no mesmo ano. Os proprietários optaram por Sunshine Forever e colocaram um preço alto para venda, em contrapartida Brian's Time foi oferecido por valor muito menor, mas, mesmo assim, o mercado norte-americano lhe virou as costas em razão de possuir 1.54m de altura e pesar em média 431 quilos aos 3 anos, além de não ser considerado um tipo fisicamente atraente. 

Koichiro Hayata, proprietário da Hayata Farm, pretendia originalmente importar Sunshine Forever, mas não conseguiu fechar acordo devido a alta soma pedida por ele. Então Brian's Time foi adquirido em 1989 por possuir quase a mesma linhagem sanguinea. A principal motivação naquele momento é que Real Shadai, também filho de Roberto, estava fazendo grande sucesso como garanhão no Japão.

Brian's Time servindo na Hayata Farm, ilha de Hokkaido, foi bastante prestigiado pois teve em suas 3 primeiras gerações 186 filhos. Ele iniciou através de suas filhas uma dinastia de classe que perdura até os dias de hoje. Posteriormente diante do enorme sucesso de Brian's Time, um consórcio japonês comprou Sunshine Forever, mas esse manteve no Japão o mesmo perfil demonstrado nos EUA de baixa qualidade em sua prole.

Brian's Time produziu 52 vencedores de provas de grupo e é avô materno de 20 vencedores dessas mesmas provas. A produção de Brian's Time se caracterizou por ter muita longevidade e resistência, provavelmente devido a linhagem de sua mãe que possuía Ribot, somados a uma capacidade de alto rendimento tanto na grama como no dirt.

Dentre seus filhos pode-se destacar os excepcionais campeões Narita Brian - tríplice coroado japonês nascido da primeira geração de Brian's Time e Mayano Top Gun, ambos eleitos "Horse of the Year" no Japão. A partir do seu quarto ano no haras Brian's Time passou a ser considerado garanhão de elite e em 1994 serviu 79 éguas, número digno de nota para o turfe de então.

Devido a presença de Sunday Silence, ele não conseguiu vencer o ranking de garanhões no Japão, mas, foi 2º colocado nas estatísticas de 1995/1996/1997/ 2000/2002/2003 e 2005, 3º colocado em 1994/1998/2001/ 2004/2006/2007 e 2008.

Como avô materno foi 2º colocado em 2012/2013/2014 e 3º colocado em 2010/2011 e 2016.

Foi eleito JRHA Stallion of Merit.

Junto a Sunday Silence e Tony Bin (ambos pertencentes ao Grupo Shadai, a maior organização do turfe japonês) formou os três melhores garanhões do Japão na época. Brian's Time que era utilizado por haras menores nunca teve acesso a éguas "estrelares", mas,  mesmo servindo éguas de qualidade inferior se mostrou uma grande força reprodutiva, colocando-se no mesmo patamar de seus concorrentes da Shadai. Brian's Time ficou por 16 anos consecutivos entre os 10 primeiros garanhões no All Japan Stallion Ranking.

Sunday Silence foi classificado entre os 10 primeiros por 14 anos consecutivos e Tony Bin por 12 anos consecutivos. Embora Brian's Time tenha tido menos oportunidades com éguas de maior qualidade no comparativo aos garanhões da Shadai, ele esteve entre os 10 primeiros do ranking japonês por mais tempo.

Brian's Time se mantêm ativo na classe através da descendência de suas filhas. Ele é avô materno de Espoir City (Gold Allure), garanhão bastante útil e Dee Majesty (Deep Impact), um vencedor de grupo 1 e que com poucos produtos em pistas se inicia como um garanhão bastante promissor. Dentre seus muitos netos ainda em atividade é possível destacar os vencedores de G1 Time Flyer (Heart's Cry), Naran Huleg (Gold Allure), Mutually (Pyro), Micke Fire (Sinister Minister), além de diversos outros vencedores de G2 e G3. 

A demanda japonesa por garanhões para o dirt tem aumentado e é grande a expectativa de que seu filho Furioso (Japan Dirt Derby), ótimo vencedor nesse tipo de pista, apresente um produto de maior classe para que essa linha masculina possa prosseguir sua hierarquia. 




Brian's Time

















quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Os "japoneses" - Tony Bin

 




Tony Bin, 27-15-5-4, nasceu na Irlanda em 1983, sendo criado por Patrick O'Callaghan, mas defendeu nas pistas a farda do Allevamento White Star, do empresário italiano Luciano Gaucci.


Resultados em grupo 1:

2 anos:

3º Gran Criterium (Ity-G1,1500m), 

3 anos:

2º Gran Premio del Jockey Club (Ity-G1, 2400m),

3º Gran Premio d'Italia (Ity-G1, 2400m),

4 anos:

1º Gran Premio del Jockey Club (Ity-G1, 2400m),

1º Gran Premio di Milano (Ity-G1, 2400m),

1º Premio Presidente della Repubblica (Ity-G1, 2000m),

2º Prix de L'Arc de Triomphe (Fr-G1, 2400m),

2º Grand Prix de Saint-Cloud (Fr-G1, 2400m),

2º Premio Roma (Ity-G1, 2800m),

5 anos:

1º Prix de L'Arc de Triomphe (Fr-G1, 2400m),

1º Premio Presidente della Repubblica (Ity-G1, 2000m),

1º Gran Premio di Milano (Ity-G1, 2400m),

2º Gran Premio del Jockey Club (Ity-G1, 2400m) e

3º King George & Queen Elizabeth Diamond S. (GB-G1, 2400m).


Tony Bin ao fim de 1988, foi eleito European Champion Older Horse. Ficando um quilo acima da notável Miesque. 

Vendido em 1989 por US$ 4 milhões para a família Yoshida, valor extremamente elevado para a época, foi levado para servir na Shadai Stallion Station, em Shiraoi, Hokkaido. 

Sua aquisição, no mesmo ano em que o norte-americano Brian's Time foi comprado, incorporou ao élevage japonês  2 futuros excepcionais garanhões que se juntaram a Northern Taste, Maruzensky e a Tesco Boy, o mais antigo influente garanhão da criação japonesa moderna.

Tony Bin se tornou leading sire em 1994, 2º em 1998, 1999, 2001 e 2002, 3º em 1993, 1996, 1997, 2000 e 2004. Devemos notar que a partir de 1995 Sunday Silence passou a dominar as estatísticas gerais japonesas com a chegada de seus primeiros filhos às pistas, até aquele momento havia uma disputa acirrada entre Tony Bin e Brian's Time.

A produção de Tony Bin se mostrou imbatível nas longas retas de Tóquio e Niigata, e a maioria das vitórias em G1 de seus filhos aconteceu em Tóquio.

Tony Bin produziu entre outros à:

- Air Groove, (1997 Horse of The Year and Best Older Filly or Mare, nomeada Reine-de-Course mare), a mais importante matriarca do turfe japonês moderno. Já comentamos sua produção no artigo "Os japoneses - Northern Taste".

- Jungle Pocket, vencedor do Tokyo Yushun (Derby japonês) e Japan Cup, 2001 JRA Award for Horse of the Year and Best Three-Year-Old Colt.

- Winning Ticket, vencedor do Tokyo Yushun (Derby japonês),

- North Flight, vencedor do Yasuda Kinen (a mais importante prova de milha japonesa) e Mile Championship.

- Telegnosis, vencedor do NHK Mile Cup e com mais de US$ 3 milhões de premiação, isso em 1997...

- Vega, vencedora do Yushun Himba (Oaks japonês) e Oka Sho (1000 Guinéus japonês).

- Lady Pastel, vencedora do Yushun Himba (Oaks japonês).

- Sakura Chitose O, vencedor do Tenno Sho (Autumn).

- Offside Trap, vencedor do Tenno Sho (Autumn).

Como avô materno Tony Bin manteve seu alto nível através de seus netos, podemos destacar dentre seus vencedores de grupo 1:

- Heart's Cry, JRHA Stallion of Merit, notável garanhão, que junto com Deep Impact e King Kamehameha (o triunvirato de ouro da Shadai Station Stallion) dominou o turfe japonês na última década. 

- Rulership, atual 7º colocado nas estatísticas gerais japonesas, 

- Admire Groove, 2004 JRA Award for Best Older Filly or Mare, mãe de Duramente, atual 2º colocado nas estatísticas gerais do Japão, 

- Current Chan, 2011 JRA Award for Best Sprinter or Miler 2012 JRA Award Best Older Filly or Mare.

- mais Transcend (garanhão), Earnestly (garanhão), Copano Richard (garanhão) e Admire Don (garanhão líder na Coréia do Sul).


                       

Tony Bin é pai de 30 vencedores de provas de grupo e avô materno de 52 vencedores dessas provas.


Foi 2º colocado nas estatísticas japonesas em 2008, 2009, 2010 e 2011, 3º colocado em 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2012, 2013 e 2014. Nas estatísticas de avô materno foi 2º colocado em 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012, 3º em 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2013, 2014 e 2016.

Eleito 1994 Best Stallion in Japan.

Tony Bin confirmou plenamente todas as esperanças nele depositadas e se firmou como um dos mais importantes garanhões que serviram no Japão em todos os tempos, com a sua influência se perpetuando na alta classe até os dias de hoje. 















quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Varola - Análise de tendências - 6ª parte

 




(continuação)


O fenômeno do brilhantismo iniciou-se em escala mundial  com Phalaris, prosseguindo com Hyperion e Nearco. É um fenômeno típico do século XX. Não que anteriormente não tivesse havido cavalos especializados em velocidade, mas eram limitados em sua tarefa e não ascendiam a símbolos da raça. Na série de Vuillier, de fato, não encontramos nenhum cavalo especificamente brilhante, enquanto em qualquer série de chefes-de-raça do século XX não podem ser omitidos os nomes de Phalaris, Orby, Cicero e assim por diante até Fair Trial, Nearco e Nasrullah. A ascendência de alguns reprodutores brilhantes a ponto de chegarem a representar símbolos da raça está intimamente ligada à popularização do espetáculo hípico e, por esta razão, comparei os vários grupos de chefes-de-raça com o hemiciclo formado pelos parlamentares e coloquei os brilhantes como sendo da  extrema esquerda e os stayers mais os profissionais como da extrema direita. A evolução da competições hípicas, de passatempo de particulares para espetáculo destinado às massas, foi o que fez oscilar o pêndulo da direita para a esquerda, fenômeno idêntico observado no que diz respeito ao desenvolvimento geral da raça puro-sangue.

Já vimos que o flagelo da Inglaterra é o excesso de Phalaris, o excesso de Hyperion, o excesso de Orby e o excesso de Cícero e que a França, ao contrário, está quase  completamente livre destes sangues, podendo criar pedigrees até mesmo 100% isentos de brilhantismo. A posição da Itália é intermediária; aproxima-se mais dos índices do tipo francês do que aos do tipo inglês, embora a importação de sangue clássico inglês sempre tenha sido intensa, especialmente por intermédio das coberturas. Mas a Itália sempre teve uma apresentação genealógica característica, tocando-lhe a sorte de poder contar com importantes matriarcas, tais como Fausta e Catnip, ambas filhas de Spearniint; de absorver Tracery através de Nera di Bicci, Talma, Barbara Burrini e Ulrika Eleonora, de absorver Hurry On através de Nesiotes, Nuvolona, Athea, Captain Cuttle, Pilade e Niccolo DeIl'Arca e de ter Havresac II e Ortello como garanhões predominantes pelo período de vinte anos.

Um dos paradoxos da criação italiana no período entre as duas guerras foi, com efeito, que ela se valorizou além das fronteiras por influência dos produtos de Dormello, mas esta recebeu sua força básica dos garanhões da Razza Ticino em Gornate: Havresac II e Ortello.

O primeiro era estreitamente inbred sobre RabeIais e isento de elementos brilhantes no seu «pedigree», enquanto o segundo, além de filho de Teddy, era inbred sobre Hampton, protótipo da solides e era ainda portador de uma corrente de Rabelais. Nearco não funcionou na Itália. Hyperion jamais esteve presente em doses maçicas na Itália, mesmo porque se desenvolveu no período bélico, quando estavam  interrompidas as comunicações com a Inglaterra. Dos poucos "Fairway" italianos, Ettore Tito foi exportado ainda em tenra idade. Frederico Tesio sempre procurou os  garanhões clássicos na Inglaterra, jamais cultivou os velocistas e, embora os tenha utilizado, não foram estes os que lhe deram garanhões e reprodutoras importantes. Aliás, jamais houve na Itália um rico programa de provas para os velocistas.

Com justa razão, a revista "Turf y Elevage Sudamericano" pode registrar em um de seus números: "... consideramos que hay que ser cautor en eI empleo de los padrillos sprinter... Consideramos que los italianos son los que han sabido evitar esta moda perniciosa ... ". Nota-se que este elogio dirige-se especificamente à criação italiana e não a outras que também estão igualmente isentas do perigo dos sprinters.

Colocando no índice 4 a relação mínima entre sangues brilhantes e sangues consistentes, para alcançar as distâncias clássicas, notamos que todos os maiores vencedores italianos estão muito além desse índice. Citando ao acaso, temos: 

a) com índice 4 e 1/2, Ribot, Bragozzo e Antelami; 

b) com índice 5 e 1/2, Toulouse Lautrec; 

c) com índice 6, Traghetto, Molvedo, Scai e Malhoa; 

d) com índice 7, Tissot; 

e) com índice 8, Antonio Canale; 

f) com índice 14, Braque; 

g) com índice 16, Alipio, e assim por diante, 

isso usando para o cálculo apenas os 50 garanhões chefes-de-raça suplementares que brevemente apresentarei, os índices seriam ainda mais altos. E as fêmeas clássicas italianas apresentam em geral índices não menos altos que os dos machos. Por exemplo, o de AIibeIIa é 6, o de Bronzina é 8, etc.

Se, portanto, o problema italiano fosse apenas o  de obter dosagens suficientes, já estaria resolvido e os criadores italianos poderiam dormir tranquilos. Mas, além do fato de que na criação de cavalos não é possível adotar tão cômoda posição, existem pelo menos três observações importantes a serem feitas, que atenuam em parte o otimismo das dosagens.

1ª -  As dosagens acima citadas são avaliadas posteriori, enquanto a grande utilidade da dosagem é a de permitir uma avaliação a priori. O criador pode determinar, antecipadamente, embora por ampla aproximação, as características da produção que deseja obter. É um trabalho a longo prazo que, uma vez iniciado, deve ser mantido de ano para ano e também por gerações sucessivas, a fim de obter resultados apreciáveis. A utilização das dosagens somente a posteriori pode servir, é verdade, como sinal de alarme; mas, considerando-se o ciclo um tanto longo das operações de criação, corre-se o risco de receber o alarme quando já é tarde demais para tomar providências. Portanto, as dosagens deveriam servir tanto ao estudioso, que as pode apreciar somente a posteriori, quanto ao criador, que é o único em condições de poder servir-se delas «a priori».

2ª - Os bons índices de consistência observados nos expoentes clássicos italianos não nos devem enganar, porquanto o índice é apenas o resultado sintético da dosagem, mas esta exprime-se antes de tudo e  principalmente pelo diagrama. Um diagrama ideal é 5-5-5-5-5 e, com relação a este ideal, o pedigree médio italiano apresenta pelo menos dois desajustes bastante graves: um no setor brilhante e outro no setor robusto.

No setor brilhante, a ausência é frequentemente exagerada até à inexistência. Em outras palavras, o índice não é obtido por relações tipo 25:5 ou 20:4, etc., mas por relações em que o dividendo se encontra contra um divisor 1 ou um divisor zero. Por exemplo, Braque é índice 14 porque este é o produto da divisão 14:1 e, da mesma forma, Sedan 12:0, Antonio Canale 8:0, Toulouse Lautrec 11:2, Bonnard 8:2, Bragozzo 9:2, Ribot 9:2, etc. Isto é, os expoentes clássicos não possuem em geral mais de um ou dois nomes brilhantes no pedigree e, com frequência, não possuem nem mesmo um. E verdade que é preciso controlar a influência brilhante para evitar que ela venha a predominar em detrimento de outras qualidades, mas também é verdade que não é possível prescindir totalmente da contribuição brilhante para fazer progredir a raça. Pode-se, portanto, afirmar que a criação italiana evitou os prejuízos do brilhantismo de tipo inglês, mas ao preço de não poder infundir em seus produtos a dose que em cada caso seria desejável. O mesmo pode-se dizer, ao contrário, com relação aos nomes robustos. Há um excesso destes e é comum no pedigree italiano a distribuição, por exemplo, 2-4-4-8-4, na qual como se vê, o índice de consistência 20:2 = 10 é obtido não só a custa da escassez de nomes brilhantes, mas também graças à exagerada presença de nomes robustos. Estes últimos são apreciados, mas sua superabundância pode dar origem a uma certa vulgaridade que pesa quando, por exemplo, um garanhão italiano se encontra em atividade no Exterior, em um ambiente de qualidade difusa média. Portanto, também a abundâncIa de Spearmint e de Rabelais, que se encontra na criação italiana, foi a que  a salvou da inconsistência, mas pode, caso seja demasiado acentuada, criar uma monotonia genética que, a longo prazo, se reflete na qualidade média.

Como prova do que acima foi dito, apresento o seguintes dados relativos a diversos garanhões italianos vivos,  escolhidos entre os de nível médio e, portanto, típicos:

Índice de consistência

Morengo ......................17

Seaulieu ......................16

Verdun .........................13

Iroquois ....................... 11

Songkoi ....................... 8 1/2

Este ............................  8

Barda Toni...................  7

Golfo ........................... 7

Nakamuro.................... 7

Fiorilio ........................  6

Scai ............................ 6

Alniorú .......................  4

Arísteo .......................  4

Tais índices correspondem aos seguintes diagramas:

Morengo...................... 0-2-3-9-3

Seaulieu ......................1-3-2-9-2

Verdum ....................... 0-0-3-8-2

Iroquois ....................... 1-2-3-4-2

Songkoi ....................... 2-2-2-9-4

Este.............................. 0-1-0-7-0

Barba Toni ................... 2-2-3-6-3

Golfo.............................1-1-0-6-0

Nakamuro.....................1-2-1-3-1

Fiorilio...........................1-1-2-2-1

Scai ..............................1-1-1-2-2

Alinoró ..........................1-2-0-2-0

Aristeo ..........................1-0-0-4-0


Somando-se os vários grupos, nota-se que as presenças do setor robusto (71) são mais numerosas que as dos outros quatro setores reunidos e que as presenças do setor brilhante (12) são inferiores às de qualquer outro setor (intermediários  20, clássicos 19 e profissionais 20).

3ª -  As duas observações precedentes levam inevitavelmente à terceira: o velocismo na Itália é quase inexistente. Quem desejar, criar velocistas fá-lo-á por sua própria conta e risco, porquanto nos programas não existem prêmios adequados a tal especialidade. Esta ausência de especialização evita o perigo do brilhantismo, mas, repetimos, levada ao excesso, evita também a introdução na criação da porcentagem justa de sangue veloz, necessária à evolução natural. O defeito dos pedigrees italianos é o de serem demasiado pobres em sangues nobres, não obstante as notáveis importações de reprodutoras e de coberturas.

Uma primeira providência poderia ser a de instituir uma grande prova nacional de milha, precedida e contornada por outras provas adequadas. Se isso chegasse a diminuir alguns dos inumeráveis grandes prêmios que atulham os programas, o mal não seria tão grave e a vantagem a longo prazo constituiria uma compensação mais do que adequada.


(continua)