Meu Caro amigo,
Ainda sobre o garanhão. Deixei claro, que no início,
você não deve ter garanhão e sim, comprar coberturas dos garanhões existentes
na região.
Para transportar a égua
mesmo com cria ao pé, para os haras vizinhos, adquira uma carreta
apropriada para o transporte de 2 equinos, que pode ser puxada por um utilitário.
A égua deverá sempre ser acompanhada pelo cavalariço e do gerente do haras,
para que o mesmo constate todas as condições do serviço e se o garanhão
contratado é o mesmo que irá servir a tua égua. Não podemos esquecer que
vivemos em um turfe de segundo mundo e até um erro como esse pode acontecer.
Evite de ter sua égua hospedada em haras onde estiver
estacionado o garanhão que vai cobri-la. A égua sente a mudança de ambiente, de
ração, enfim, do trato. Isto deve ser feito, no caso do garanhão estar
estacionado no Posto de Monta ou em haras afastado do seu. Neste caso, a égua
deve ser enviada com antecedência para se adaptar a nova situação.
Quanto a utilização ou não de inbreedings digo que tudo depende do que o estudo específico de
cada cruzamento lhe dirá e da filosofia de criação. Os Seabra, por exemplo,
durante seu período áureo, só criavam animais outcross e o Haras Mondesir também. O Haras Faxina vai além e busca
mais ainda a abertura de pedigrees usando garanhões norte-americanos (EARLDOM e
DADDY R) sobre éguas de matriz europeia e argentina. Mesmo que Daddy R não tenha confirmado as expectativas, Earldom transformou-se em um dos garanhões de maior êxito na história da criação nacional. Os barões Von Leithner
também seguiram o mesmo pensamento em seu Haras São Bernardo e importaram o
norte-americano PASS THE WORD, para servir suas éguas, que em maioria
respondem pela combinação das genéticas Rothschild e Boussac, obtendo assim
extraordinário resultado. Esse mesmo sucesso com animais outcross o Haras Rosa do Sul está conseguindo com o também norte-americano TUMBLE LARK sobre
éguas argentinas, os exemplos são BIG LARK e DARK BROWN.
Os Paula Machado também só criam animais outcross e têm como maior ênfase na sua
criação a combinação de linhagens convergentes, como já lhe disse
anteriormente. Na Europa a criação Aga Khan também só cria animais outcross. É indiscutível que os produtos
outcross de forma predominante
possuem mais saúde e vigor físico que os animais provenientes de inbreeding.
Mas o inbreeding
bem utilizado é extremamente válido e me recordo de HYPERIO, um dos melhores cavalos
de sua geração, um filho de Amphis em Zabaglione. Ele possui um inbreeding 3x3
sobre o chef-de-race PHAROS através
de seus 2 melhores filhos, os também chefs-de-race
PHARIS e NEARCO. E Hyperio ainda possui os chefs-de-race
TOURBILLON e HYPERION, como pais de suas avós! Pois é, conforme comentei
anteriormente sobre o imediato sucesso do Haras Vale da Boa Esperança era esse
o nível de qualidade da genética que Júlio Cápua tinha em seu pequeno e modelar
haras em Petrópolis.
O grande craque brasileiro ZENABRE é um 3x3x5 também
sobre PHAROS. Zenabre era muito manso e sempre padeceu consequências de problemas
ocasionados por seus joelhos; ao contrário de Hyperio, que era extremamente
temperamental mas muito saudável, e só foi retirado das pistas quando o problema
ocasionado por acidente de carreira, no início dos 3 anos e que custou sua
invencibilidade, se agravou no final dos 4 anos.
O que temos? Ambos extraordinários indivíduos com inbreeding sobre PHAROS e com
temperamentos e questões de saúde totalmente diferentes. Consequentemente, ao
pensarmos em inbreeding , temos que
considerar o perfil dos descendentes daquele indivíduo ao qual objetivamos a
consanguinidade.
No caso de Zenabre o que podemos observar que seu avô
materno SEVENTH WONDER (por Pharos), 3º nos 1000 metros do Norfolk Stakes correu
apenas 10 vezes por ter mancado de joelho. Seu pai, o notável garanhão PHARAS
(por Pharis - Pharos) correu apenas duas vezes e venceu ambas, sendo uma delas
o Prix du Lys, G3 em 2400 metros, foi retirado prematuramente das pistas por problemas físicos.
Pharos se notabilizou por além da alta classe transmitir problemas de joelhos. Tal somatório não interferiu na altíssima
classe de Zenabre, mas, evidentemente influenciaram na trajetória de sua
campanha.
Resumindo, ambos eram inbreeding em Pharos, mas Hyperio o
era através de 2 veios saudáveis - Amphis e Nearco (3x3) - e Zenabre através de
2 veios não saudáveis - Pharas e Seventh Wonder (3x3) - e 1 saudável na quinta
geração, Rhodes Scholar.
É evidente que não existe uma fórmula mágica que nos
ofereça a certeza para a obtenção do grande craque ou mesmo um bom cavalo,
lembre-se que a criação do PSI é um jogo de xadrez contra a natureza. Mas, o
nosso papel é minimizar o tremendo
handicap que a natureza tem contra nós e procurar seguir os caminhos que nossos
estudos nos indicam.
Vamos rememorar juntos, a notável égua EMERALD HILL (Locris x Embuia), sem dúvida do que de melhor se tem criado no turfe brasileiro e que já passou para a galeria das grandes éguas do nosso turfe: JOIOSA – DULCE – GARBOSA BRULEUR - PLATINA – ELAMIUR - JACUTINGA - DONÉTICA e FONTAINE. A sua mãe Embuia, resultou do acasalamento de Emócion com Sunny Boy, um bom stayer francês e que pertence a família 16-a, a de CONCERTINA, uma das 10 melhores linhas maternas do mundo, mãe de PLUCKY LIEGE (mãe de BOIS ROUSSEL, ADMIRAL DRAKE e SIR GALLAHAD) e avó materna de FRIAR’S DAUGHTER (mãe de BAHRAM e DASTUR). Linha materna dos nossos conhecidos MANACOR (Corpora e Mallorca) e do tríplice coroado AFRICAN BOY(Felicio e Liselotte). Veja só a qualidade das éguas importadas por nossos criadores, o que garantirá para o futuro a existência de ótimas famílias maternas adaptadas ao nosso meio, aos moldes do que fazem os criadores argentinos. Note que African Boy vem por Niloufer e Manacor por Fille de Salut, veios distintos de FRIAR’S DAUGHTER. Essa genética materna de ponta do turfe mundial, deve ser preservada como um tesouro através do aproveitamento na reprodução das filhas de LISELOTTE e MALLORCA.
Só espero que as novas gerações de criadores, que já se mostram em adiantado processo de aculturamento norte-americano, não ponham a perder genéticas europeias e argentinas trazidas a peso de ouro pelos Seabra, Paula Machado, Peixoto de Castro, barão e baronesa Von Leithner, Henrique de Toledo Lara, Mariano Raggio e alguns outros criadores com elevado senso técnico.
Isso não quer dizer que as raras combinações genéticas de qualidade existentes nos EUA devam ser ignoradas por nossos criadores. O sucesso de Earldom, Pass The Word e Tumble Lark assim o comprovam.
Embuia foi o primeiro produto de Emócion e lembro-me bem,
que quando soube que voltara prenha da Europa por um stayer (mas que havia
vencido a estatística francesa), confesso que não gostei, isto é, eu não teria
escolhido Sunny Boy. Mas, para cobertura de nascimento sul-americano, não é
fácil obtê-la dos garanhões desejados, mesmo com disponibilidade financeira
para tal, e, conseguir do Sunny Boy para este período, já fora muito difícil conforme
me disse Roberto e que o objetivo para esse cruzamento era, com sorte,
conseguir uma fêmea para ser incorporada futuramente ao seu plantel de
reprodutoras. Nasceu Embuia e daí EMERALD HILL...
Criação do PSI meu bom amigo é, antes de tudo, possuir
conhecimento da raça para planejar corretamente e ter visão do futuro!
Quanto a essas questões de cruzamentos e aptidões
funcionais, aconselho a que preste muita atenção a tudo que Franco Varola diz
em nossas reuniões! Estudar o seu livro
“Typology of the Racehorse” é fundamental para que você amplie seu entendimento
sobre transmissão da herança aptitudinal no PSI.
Franco comentou em nossa última reunião na cocheira Rocha
Faria, à qual você faltou, que está finalizado o seu próximo livro, uma
continuação e complementação com novas ideias do primeiro. Mas como não
encontrou patrocínio do JCB e JCSP para publicação de 500 exemplares
comemorativos, à qual abriria mão de seus direitos para essa tiragem em
português, desde que o mesmo fosse vendido a preço de custo por essas
entidades, o está enviando para a JA Allen, editora de seu primeiro livro.
Estou sempre receoso de ter sido pouco claro nessas
cartas. Mande-me uma palavra sobre isto.
O que me tranquiliza é que posso em outros colóquios,
voltar a certos pontos (o que já tem acontecido por mais de uma vez) e levar
uma palavra ou exemplo, que venha preencher algum claro deixado.
Que o amor pela criação continue desperto em você e que
reconheça que ela é Divina e nos cabe somente dar as melhores condições para
que ela se realize, interferindo o menos possível.
Reynato Sodré Borges
Tebas - agosto - 1979