sábado, 21 de março de 2020

Coronation, um pedigree incestuoso.




Ler o pedigree de Coronation, vencedora da edição de 1949 do Prix de L’Arc de Triomphe (Gr.1), nos deixa sem palavras: seu pai Djebel é filho de Tourbillon e sua mãe Esmeralda também é filha de Tourbillon. O que chamamos de consanguinidade 2x2 com, no caso dela, a adição de um 4x4 em Teddy, avô de Djebel e Esmeralda .




Difícil evitar o termo incestuoso para um cruzamento que envolve um garanhão e sua meia-irmã, mas essa fórmula foi, no entanto, frequentemente usada em Fresnay-Le-Buffard. Nosso amigo Yves d'Andigné, expert da criação Boussac, nos disse que Marcel Boussac fez 27 cruzamentos com Tourbillon em 2x2 entre 1944 e 1957 (dois por ano), resultando em dez abortos ou vazias, oito machos e nove fêmeas, incluindo Coronation e Cosmopolia (invicta aos 2 anos de idade, incluindo o Prix de La Salamandre, Gr.1).




Os criadores dessa época consideravam que a consanguinidade estreita era um mal necessário para fixar os caracteres da raça em sua base, mas se recusaram a usar essa prática. O contexto da Segunda Guerra Mundial mudou a situação, porque não havia como se transportar éguas de um haras a outro para utilização de garanhões de terceiros. Consequentemente, vários criadores foram obrigados a utilizar garanhões próprios e cruzando-os com as éguas presentes na fazenda, muitas endogamias  próximas foram realizadas, um pouco pela força das circunstâncias. Às vezes, com resultados felizes, o que levou Marcel Boussac a seguir sua estratégia de criação nessa direção.

Esplêndida potranca nascida em 1946 no Haras de Fresnay-le-Buffard, Coronation provou ser precoce e talentosa o suficiente para começar vitoriosamente em 6 de junho de seu ano de dois anos. Ela então venceu 27 oponentes no Queen Mary St. (Gr.3) no Royal Ascot antes de dominar os machos no Prix Robert Papin (Gr.1), mas um declínio repentino de forma foi a causa de decepcionantes performances no Prix Morny (Gr.1 - terceiro), corrida anteriormente vencida por sua mãe Esmeralda, e no Cheveley Park St. (Gr.1). A consanguinidade de seu pedigree foi obviamente responsabilizada por essa fragilidade na manutenção de sua forma  física.



Coronation.


Mas Coronation redescobriu o caminho para o sucesso na primavera de seus três anos, vencendo a Poule d'Essai des Pouliches (Gr.1) em seu retorno, antes de conceder por pouco a vitória a Musidora na Oaks St. (Gr.1) e a Circus Lady nos Oaks irlandeses (Gr.1), aguardando a consagração suprema que obteve com sua esmagadora apresentação no Prix de L’Arc de Triomphe (Gr.1). Após o decepcionante segundo lugar para Violoncelle no Prix d'Hédouville, na primavera de seus quatro anos, Coronation foi retirada no ano seguinte, em 1951, para a reprodução em nome de seu criador, Marcel Boussac.




Tourbillon, duplo avô de Coronation.



Servida naquele ano por Marsyas, infelizmente foi testada vazia. Ela conheceu Pharis,  pastor-chefe do haras, em 1952, 1953 e 1954. Restando sempre vazia. Depois foi a vez de Owen Tudor em 1955, Pharis novamente em 1956 e Auriban em 1957 e 1958, e ainda não havia potro a caminho. Marcel Boussac insiste: Coronation será servida por Iron Liege em 1959 e por Auriban em 1960, 1961, 1962, 1963 e 1964, o ano de sua morte (aos 18 anos), infelizmente sem produzir a nenhum potro.

Coronation entrará na história como a majestosa vencedora do Prix de l'Arc de Triomphe (Gr.1), e levará sete décadas para que outra égua com fortíssima consanguinidade, a campeã Enable, seja premiada por sua vez nesse teste de prestígio.







Os vários estudos que realizamos sobre reprodução mostram claramente as vantagens da consanguinidade, desde que tecnicamente bem fundamentada. Se alguns criadores consideram que um coquetel genético tem sabor apenas a partir de um certo grau de consanguinidade, outros recusam totalmente essa fórmula para preferir, a qualquer custo, outros caminhos. Mas, por exatamente vinte anos, um único vencedor de Gr.1 no mundo reivindicou um pedigree livre de toda consanguinidade em seis gerações: uma potranca americana por Lemon Drop Kid que ganhou o Gamely St. (Gr.1) em 2007 e que responde ao doce nome de… Citronnade !!!



Thierry Grandsir - DNA Pedigree
Tradução do francês: Ricardo Imbassahy


N.T. Como curiosidade segue o pedigree de Locris, chef-de-race no Brasil.








M. Marcel Boussac.