quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Potencial papel da linhagem materna na criação do puro-sangue





A supervalorização na escolha dos garanhões e uma subseleção das mães na criação de puro-sangue de corrida é uma pratica adotada internacionalmente e a qual cabe, em nosso entendimento, alguma reflexão para que possamos traçar estratégias que nos possibilite aumentar as chances na obtenção dos animais de elite.

Dentro dessa visão o patamar para um cavalo se tornar garanhão e ter seus filhos de primeiras produções valorizados subiu demais e ele precisa ser um vencedor de Gr.1 para ter alguma chance. Enquanto o nível seletivo para uma égua entrar em reprodução caiu para um nível bastante baixo.
É possível que as éguas ou famílias maternas desempenhem um papel mais importante na produção de cavalos de corrida puro-sangue de classe do que os garanhões?

Acreditamos que sim e existe muitas pesquisas sobre o tema, onde é possível filtrar que é uma vantagem significativa levar para a reprodução éguas ou filhas de éguas que mostraram algum talento positivo em corrida sobre outras que não tiveram nenhum.

É certo que é possível avaliar algumas das variantes associadas ao desempenho, mas não podemos medir todas e principalmente os efeitos do impacto ambiental nos genes, aspecto muito importante e que já era levantado na década de 70 por John Aiscan e antes disso pelo dr. Roberto Seabra (Haras Guanabara).

Ao selecionarmos filhas ganhadoras de éguas com desempenho acima da média acreditamos que estamos potencializando herdabilidade.

Um aspecto interessante sobre essa questão é que diversos estudos demonstram que as próprias éguas não precisam realmente ter um desempenho em corrida de alta classe para oferecer um valor significativo em termos de seu potencial para produzir um corredor superior, mas apenas um bom desempenho positivo.

Todas as evidências apontam para a importante contribuição da qualidade das éguas na capacidade de performance de corrida de seus filhos, consequentemente é esperado que as éguas desempenham papel mais importante na produção de cavalos de elite do que os garanhões.

O pesquisador Xiang Lin e seus colegas, observaram que a maior parte dos estudos existentes se concentram na identificação dos genes associados à habilidade atlética dos puros-sangues, mas poucos consideraram diferenças na hereditariedade materna e paterna na transmissão da capacidade atlética.

Esses pesquisadores analisaram os desempenhos em corrida de um grupo de puros-sangues australianos. Levantaram a premiação em dinheiro e classificaram os cavalos com base em seus ganhos médios por corrida. Os 30 por cento do topo foram considerados elite e os 70 por cento inferiores foram categorizados como pobres.

Em seguida, esses 675 indivíduos foram divididos pelo desempenho de seus pais (elite ou pobre) em quatro grupos:

  • Mães de elite e pais de elite;
  • Mães de elite e pais pobres;
  • Mães pobres e pais de elite;
  • Mães pobres e pais pobres.

O desempenho de corrida dos indivíduos foi então comparado entre os quatro grupos.

Os melhores percentuais de desempenhos eram descendentes tanto de uma mãe de elite quanto de um reprodutor de elite. No entanto, surpreendentemente, os descendentes de uma mãe pobre e um pai de elite provaram ser geralmente piores do que aqueles que nasceram de uma mãe pobre e de um pai pobre.

Os filhos de éguas de elite produziram resultados superiores, independentemente da categoria em que seu pai se enquadrasse.

Ficou estabelecido que a herdabilidade de desempenho entre mães e seus filhos (r=0,141) foi significativamente maior do que entre pais e seus filhos (r=0,035).
O estudo mostrou ser claro que um bom garanhão geralmente não pode negar o efeito hereditário de uma égua pobre, mas que uma égua elite pode negar o efeito hereditário de um garanhão pobre.

Reiteramos. O aspecto relevante é que as próprias éguas não precisam ter uma performance espetacular em pista para oferecer sólido aporte em termos de seu potencial para produzir um corredor superior, basta terem sido boas vencedoras.

“Os resultados mostram que a herdabilidade do desempenho da raça entre mães e filhos é muito maior do que entre pais e filhos, e que essa diferença é estatisticamente significativa”, concluiu a equipe de pesquisa.

Também foi examinado o efeito da idade reprodutiva de mães na proporção de filhos de elite.

“Encontramos uma forte correlação entre o número de filhos de elite e a idade reprodutiva das mães, com a proporção de descendentes de elite atingindo um alto nível entre a idade reprodutiva de 8 e 11 anos".

Conclusão: Esses resultados sugerem que as mães e as linhas maternas tendem a desempenhar um papel importante na reprodução seletiva do desempenho atlético no puro-sangue.


Bibliografia:

Potencial role of maternal lineage in the thoroughbred breeding strategy.

Xiang Lin, Shi Zhou, Li Wen, Allan Davie, Xinkui Yao, Wujun Liu e Yong Zhang.

https://www.publish.csiro.au/rd/RD15063


P.S.  Qualquer técnico envolvido na criação brasileira do PSI que frequente leilões internacionais irá constatar que os nossos haras, em sua maioria, entregam yearlings em condições iguais ou até melhores que reconhecidos grandes polos. E esse é um trabalho admirável de nossos veterinários e todo staff envolvido nesse elo da cadeia. Mas fica por aí, a gestão da seleção de qualidade dos plantéis no Brasil infelizmente é muito fraca e os resultados internacionais recentes assim o demonstram. Ao vermos a imensa maioria das combinações genéticas praticadas tudo se complica mais ainda, pois quando se possui poucos ovos para se fazer um omelete eles não devem ser desperdiçados...