quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Varola - Análise de tendências - 4ª parte



Match, um típico exemplo de pedigree 100% consistente.


(continuação)


No capítulo precedente deste estudo apresentei uma divisão de 50 garanhões chefes-de-raça em cinco grupos de tendências, chamados, respectivamente, brilhante (brilliant), intermediários (intermediate), clássico (classic), robusto (slout) e profissional (professional). Proponho-me agora a submeter esta classificação baseada em impressão e critério pessoais, a uma verificação, embora empírica, examinando um número suficiente de pedigrees contemporâneos, escolhidos à luz de critérios que mais adiante serão apresentados. Todavia, para manter neste trabalho um caráter de maior legibilidade, começarei por alguns casos isolados, de particular importância e atualidade, tomando, por exemplo, o pedigree do melhor cavalo veterano europeu de 1962: Match. Trata-se de um expoente da criação francesa que, após uma excelente campanha aos três anos, logrou, aos quatro anos (convém notar) vencer a prova mais importante a peso por idade do calendário inglês, sem, que a criação britânica fosse capaz de apresentar um único elemento que o pudesse ameaçar.

No pedigree de Match encontramos as seguintes presenças de garanhões chefes-de-raça: 3 vezes Rock Sand, 2 vezes Sunstar e 1 vez Teddy, Hurry On, Alcantara II, Swynford, Blandord, Fair Play, Black Toney, Tourbillon e Tracery. Um total de 14 presenças. Além disso, encontramos o nome de Sans Souci II, que não é garanhão chefe-de-raça, mas é elemento de particular consistência.

Notamos, imediatamente, que nesse pedigree não existe nenhum dos dez nomes classificados como elementos brilhantes, razão pela qual, querendo dar uma expressão numérica ao pedigree de Match, teremos: 0 + 14, ou seja, 100 de nomes consistentes.

(N.T.): Match era irmão inteiro de Reliance e irmão materno de Relko, ambos chefs-de-race. Ele morreu em seu terceiro ano de serviço como garanhão e gerou 12 vencedores de provas hoje consideradas black-types.

Comparemos agora estes dados com os que se obtém examinando o pedigree do cavalo que reinava soberano na Inglaterra quando Match atravessou o canal para sua vitoriosa incursão, ou seja, Henry the Seventh. Disse que reinava soberano, o que pode parecer ironia, porquanto, com efeito, Henry the Seventh contentou-se em vencer o Eclipse Stakes, em 2.000 metros, mas, apesar disso, foi mandado, a enfrentar o "invasor" francês no percurso bem mais árduo da milha e meia, em Ascot, sabendo-se embora que não teria chance alguma. Seu pedigree apresenta quinze nomes de garanhões consistentes contra sete de garanhões brilhantes, ou mais precisamente: 4 vezes Chaucer, 2 vezes The Tetrarch, 1 vez Gainshorough, Pharos, Teddy, Swynford, Son-in-Law, Dark Ronald, Hurry On, Tracery e Rock Sand e, do outro lado, 3 vezes Phalaris, 2 vezes Fairway e 1 vez Hyperion e Cicero. Em números convencionais, 7 + 15, ou seja, um terço de seu mais conspícuo patrimônio genealógico é formado por nomes brilhantes, enquanto o francês Match apresenta, como vimos, cem por cento de nomes consistentes.

Mas aprofundemos mais ainda olhar nestes dois pedigrees Eles têm em comum pelo menos cinco nomes: Teddy, Hurry On, Swynford, Rock Sand e Tracery. Os restantes nomes do pedigree de Henry the Seventh poderiam prestar-se, se, com efeito, quiséssemos excluir a responsabilidade das sete presenças de Hyperion, Phalaris, Fairway e Cicero, a suspeita de inconsistência poderia transferir-se para os nome que Henry The Seventh não tem em comum com Match, isto é: Gainsborough, Chaucer, Pharos, Son-in-Law, Dark Ronald e The Tetrarch, este último, convém notar, com duas presenças. Mas são todos nomes insuspeitos, exceto, talvez, The Tetrarch, o qual porém eu insisto em absolver, porquanto, tomando dois exemplos ao acaso, verifica-se sua presença também no pedigree do consistentísissimo Alcide e do não menos forte vencedor do Cesarewitch, Golden Fire.

Aliás, 2 meses após o episódio de Match, os ingleses venciam o St. Leger S. com Hethersett contra o favorito italiano Antelanii e 05 cavalos franceses. Hethersett tem um índice de consistência bem superior ao de Henry the Seventh, contando com 4 presenças brilhantes contra 20 dos outros grupos, cujo valor veremos mais adiante em porcentagem. Mas o duelo anglo-francês, em termos de dosagem, teve outro e muito interessante desenvolvimento no ano seguinte, por intermédio do campeão dois anos inglês Crocket que se impôs nos Dois Mil Guinéus, enquanto logo após o francês Relko, parente próximo de Match, passeava no Derby de Epson. Em Crocket, as presenças de garanhões chefes-de-raça são expressas pelo símbolo 7-25 e em Relko, por 2-20. Convém notar, portanto, a impressionante semelhança dos índices de Crocket com os de Henry the Seventh, e a não menos significativa semelhança das estruturas genealógicas de Relko de Match.

Mas voltemos ao pedigree de Henry the Seventh. Se dividirmos 15 por 7 obteremos um quociente de 2.14, que pode ser considerado o índice de consistência deste cavalo. É óbvio que, se em lugar de 15 chefes-de-raça consistentes, tivermos, digamos, 28, o índice seria 28 dividido por 7 = 4 e, ao contrário, se em lugar de 7 chefes-de-raça brilhantes tivéssemos apenas 3, o índice seria 15 dividido por 3 = 5, e assim por diante. Mas ainda não sabemos qual seja o índice ideal de nossa pesquisa, o ponto central ao qual reportar qualquer caso concreto. Para uma melhor orientação, tomemos um grupo de cavalos inglêses nascidos em 1959 que, com dois anos, ou seja em 1961, foram de primeira categoria, mas com três anos, tornando-se mais longa as distâncias, não foram mais capazes de vencer ou apenas pontificaram em distâncias breves e médias. É um dos mais singulares casos destes últimos anos, significando toda a elite de uma geração que não se pôde realizar. É possível que consigamos descobrir um fator comum ao qual ligar esta inconsistência. Ao lado do nome de cada produto colocamos os dois números que representam respectivamente o total dos nomes brilhantes e o total dos nomes consistentes e, em seguida, o quociente ou índice resultante da divisão dos dois números e obteremos o que se segue:

Miralgo .................... 4 - 13 = 3,25

Display (f) ................ 5 -  8  = 1,60

La Tendresse (f) ...... 5 - 14 = 2,80

Escort ...................... 3 -  9 = 3,00

Caerphilly (f) ............ 5 - 16 = 3,20 

Gustav ..................... 4 - 15 = 3,75

Compensation ......... 9 - 14 = 1,55

Sovereing Lord ........ 4 - 14 = 3,50

Romulus .................. 6 - 18 = 3,00

Bow Tie ...................  6 -  9 = 1,33


Notamos, imediatamente, que se trata de índices um tanto baixos, mais ou menos próximos ao de Henry the Seventh e afastadíssimo do de Match, que é 14. Porém, o indíce de Match não constitui um ponto de referência definitivo, porque faltam completamente em seu pedigree os elementos brilhantes e, portanto, é impraticável fazer o cálculo        de proporção. Além disso, os números que apresentei mais acima são sintéticos, inclusive por razões a brevidade de exposição. Por exemplo, os 18 nomes consistentes de Romulus deveriam, por sua vez, ser divididos em quatro grupos, segundo a tabela apresentada no capítulo precedente. A fórmula tabulada é a que indica o equilíbrio geral do pedigree, mas, por enquanto, estamos interessados em chegar a algumas conclusões sobre o índice de consistência. Façamos então o raciocínio inverso tomando os nomes dos cavalos que, no mesmo período, na Inglaterra, venceram provas de mais fôlego ou pelo menos mostraram uma consistência satisfatória. Tome-mos, pois, o mencionado vencedor do St. Leger, Hethersett. o ganhador do precedente St. Leger, Auretius, o laureado da Copa de Ouro de Ascot , Pandofell, o cavalo Die Hard, que teve êxito em 2.800 metros, a égua Alcove, que venceu nos 3.800 metros, e o herói do Derby Irlandês de 1961, Your Highness. À primeira vista, trata-se de um grupo sólido e totalmente oposto ao anteriormente examinado. Vejamos os índices que apresenta:

Hethersett ................... 4 - 20 = 5,00

Aurelius ....................... 3 - 14 = 4,50

Pandofeil ..................... 1 - 10 = 10,00

Die Hard ...................... 3 - 18 = 6,00

Aleove ......................... 2 - 14 = 7,00

Your Highness ............. 1 - 14 =14,00


Evidencia-se, imediatamente, as diversas estruturas destes pedigrees. Os nomes brilhantes estão reduzidos ao mínimo e os nomes consistentes aparecem em quantidade apreciável, porém não superiores às quantidades observadas em muitos dos componentes do primeiro grupo. Chegamos, portanto, à urna primeira conclusão parcial: que a incidência de atitudes dos nomes brilhantes é, em certo sentido, mais forte que a dos consistentes. Ou, em outras palavras, quase todos os pedigrees e outro é o maior ou menor número de nomes brilhantes. Daí a grande importância de se proceder à separação do primeiro grupo de garanhões-base dos outros quatro, da formação do índice dividindo o total dos quatro grupos pelo total do primeiro grupo. Outra conclusão parcial é que um indíce de 3, segundo se constata em Romulus, ou pelo menos inferior, a 4, segundo o verificado em Sovereign Lord, Miralgo e Gustav, não parece suficiente para criar o cavalo completo, enquanto esta condição privilegiada parece ser alcançada quando o índice começa a superar - o número 4. Os casos de Pandofell e Your Highness são evidentemente extremos; neles, a presença de um único nome brilhante pode ser consideraria puramente casual e, para todos os fins práticos, traia-se de pedigrees que poderíamos chamar de "integrais", ou seja, compostos inteiramente de nomes sólidos, assim como sucede com pedigree de Match.

Assim, pois, podemos concluir que os cavalos ingleses não estão necessariamente condenados a unia posição de inferioridade nas corridas clássicas e de mais distância, mas, infelizmente, nelas agora se encontram justamente quando seu patrimônio genético compreende uma dose demasiado elevada de elementos brilhantes, e isso acontece na grande maioria dos cavalos ingleses de hoje. É interessante, a este respeito, transcrever a tabela elaborada pelo estudioso inglês Eric Rickman sobre os 211 pedigrees , tabulados que aparecem na última edição de 1962 do "Register of Thoroughbred Stallions".

Dividem-se, segundo as linhas de proveniência, da seguinte maneira:

Phalaris ................ 73 = 34,1%

Hyperion .............. 25 = 11,8%

The Boss ............. 20 = 9,5%

Total brilhante             = 55,4%

Blandford ............. 24 = 11,4%

Teddy ................... 13 = 6,6%

Tourbillon ............. 11 = 5,2%

Hurry On ..............  8 = 3,8%

Total consistente        = 27,0%


Os restantes 17,6% pertencem a linhas menores, mas é significativo que as proveniências das três origens brilhantes sejam em número superior ao dobro das quatro principais proveniências clássicas. Porém, repito, quando se evita o excesso de elementos brilhantes, os resultados podem ser altamente lisonjeiros, como no caso de Alcide, 2-16, índice 8, ou no caso definitivamente extremo de Crepello, que tem um pedigree integral, formado por nove nomes consistentes e nenhum nominativo brilhante, mais ou menos como o francês Match.

Outros exemplos probatórios são os do vencedor do Derby e do St. Leger, Never Say Die, 3-15, índice 5; Alcarus, 4-16; índice 4; Exar, 4-21, índice 5,25; e assim por diante. Mas o problema inglês é justamente que estes indivíduos de primeira ordem são rari nantes lo gurgito vasto. A situação francesa, entretanto, é oposta e às vezes chega a extremos dificilmente inimagináveis. Na França, o único sangue local que  pode levantar suspeitas de ser excessivamente brilhante em detrimento da consistência é o de Pharis, e é conveniente notar que Pharis tem estado conspicuamente ausente dos pedigrees dos grandes vencedores franceses destes últimos anos. Desde que a coudelaria Boussac deixou de ser o fator predominante nos clássicos franceses e nas excursões francesas ao exterior, os pedigrees acentuaram seu caráter de grande solidez, e até mesmo de rusticidade, porque nêles as presencas de Phalaris além de Pharis, de Hyperion e de Orby são esporádicas e, em todo caso, não contribuem para formar as características morfológicas e de atitude nem sequer de uma minoria dos cavalos criados na França. Por essa razão, é facílimo encontrar um cavalo francês com um índice alto e muito difícil encontrá-lo com um índice baixo, como se verifica na seguinte lista dos mais importantes garanhões recentes.

Garanhões franceses totalmente isentos de presenças brilhantes, ou seja, donos de pedigrees integrais: 

Alindrake, Arbar, Arbel, Avenger, Beatu Prince II, Bey, Breughel, Caracalla, Cranach (de Coronach ), Djebel, Djefou, Fine Top, Le Pacha, Magister, Marsyas, Tantieme, Northern Light, Ocarina, Phil Drake, Popof, Prince Bio, Vattel, Royal Drake, Sicanibre, Vieux Manoir, Wild Risk e Tyrone, 

Garanhões franceses com índices altos:

Alizier ................. 1-5 = 5

Chamant .............. 1-7 = 7

Clarion ................  1-6 = 6

Klairon ...............   1-7 = 7

Lavandin ............   1 - 6 = 6

Shikanspur .........   1 - 11 = 11

Silnet ...................  1 - 6  = 6

Soleil Levant .......  1- 12 = 12

Sunny Boy ..........   1- 9  = 9

Vamos .................   1 - 9 = 9

Worden .................  1 - 8  = 8

Chiugacgook ........  1 - 8  = 8

Altipan .................  1- 32 = 12

Tanerko ...............   2 - 10 = 5

Outros exemplos ainda de "pedigrees integrais" isto é, totalmente isentos de elementos brilhantes, são os dos norte-americanos Iron Liege e Hill Gail e os dos franceses Hugh Lupus, Manet e Vimy, enquanto outros exemplos de índices altos são os Ballymoss (7), Guide (12), Jock Scot (8), Pinza (7), Tehran (7), e assim por diante.

Mas, nem sempre o cálculo das presenças dos garanhões chefes-de-raça fornece um diagrama numérico em plena harmonia com as características efetivas do individuo examinado. Estes casos discrepantes, que, aliás, constituem uma minoria, devem-se ao fato de que em certos pedigrees predomina a influência de antepassados que, por urna razão ou por outra, não estão compreendidos no grupo dos 50 garanhões chefes-de-raça e, portanto, não contribuem para a elaboração da contagem, desequilibrando, além disso, o índice resultante.

Esses casos anômalos poderiam, ou não, invalidar a legitimidade das dosagens que apresento e são ainda objeto de estudo para determinar a sua eventual inclusão na lista dos garanhões chefes-de-raça. A expansão numérica e geográfica do rebanho do puro-sangue é tal que a minha própria escolha original de 50 garanhões embora  representando uma atualização no que diz respeito aos nomes de Vuillier, corre o risco de ser superada, se não for completada com os nomes dos garanhões que, nos últimos anos, assumiram importância mundial. Dessa forma, a tabela definitiva dos garanhões chefes-de-raça de nosso século incluirá ainda outros nomes, mas este é um assunto a ser  tratado mais profundamente em outra oportunidade.


(continua)