segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Princípios de acasalamentos - Tesio

 



O artigo abaixo está baseado e possui passagens  ipsis litteris do Livro "The Tesio Myth" de Franco Varola.


Sempre existiu, tanto nos estudantes do passado como nos de hoje, a tendência de se atribuir qualidades mágicas a Tesio e consequentemente ninguém nunca se referiu aos seus princípios de acasalamentos, mas sim às suas "impressões". Portanto, não é de surpreender que nunca tenha havido qualquer tentativa de uma análise sistemática, pelo menos, no que diz respeito à razão de sua escolha por acasalamentos dentro de um perfil muito específico.

Poucas informações foram obtidas do próprio Tesio quanto aos métodos ou princípios que ele seguia ao decidir sobre os acasalamentos. A única entrevista conhecida de Tesio foi uma concedida ao The Blood-Horse em 1937, na qual ele expôs superficialmente algumas de suas visões.

Tesio admitiu que raras endogamias próximas poderiam ser tentadas, mas apenas com indivíduos muito sadios e de alta classe. Ele também se mostrou favorável a se repetir nicks de comprovados sucessos, e tendo que escolher entre dois pedigrees, preferia sempre aquele em que as cinco primeiras gerações tivessem o maior número de vencedores clássicos. E Tesio acrescentou que os grandes indivíduos são sempre muito diferentes entre si em tipo, e de forma paradoxal cita que tinha visto grandes cavalos vencerem com expressões diferentes nos seus olhos, mas nunca viu algum com um olhar estúpido.

Concluindo essa entrevista, Tesio disse que quando fez parte de uma comissão italiana para comprar um garanhão na Inglaterra, havia recomendado Polymelus, que estava à venda. Mas o veterinário que inspecionou este garanhão não gostou de seus cascos rasos, assim, a história das corridas foi alterada.

Devemos notar que Tesio era propenso a combinar um garanhão bem sucedido com um garanhão imune à "contaminação" brilhante. Seu uso tão extensivo de Pharos (Nearco - avô materno Havresac II, El Greco - avô materno Gay Crusader, Bernina e Brueghel - avô materno Great Sport), certamente foi porque julgou que Pharos não era, fundamentalmente, um cavalo brilhante, e que seu esforço contra Papyrus no Derby de Epson, além de vencer o Champion Stakes e outras corridas, o qualificou como um indivíduo robusto.

A análise dos acasalamentos de Tesio no período mais significativo da sua atividade, 1921-1954, revelou a preferência de Tesio pelos garanhões Classic, e ainda mais por aqueles garanhões Classic que acrescentassem um elemento de robustez que também seria transmitido ou preservado juntamente com a classicidade. Para uma compreensão completa de seus métodos, pode ser importante averiguar quais podem ter sido as razões de sua inclinação para as aptidões Clássicas, Robustas e Profissionais, em vez das Brilhantes e Intermediárias.

Seria imprudente sugerir que Tesio ignorou que ao usar nos cruzamentos insistentemente garanhões em que a robustez e a resistência prevaleceram fortemente sobre o brilho e a velocidade, ele se arriscava a obter muitos cavalos que poderiam ser vencidos por esse desequilíbrio de pedigree, e na verdade, ele obteve muitos desses cavalos. Se, por outro lado, estava disposto a pagar esse preço, era porque tinha um motivo para isso. Mais uma vez, devemos retomar o fio do exame da posição de Tesio no negócio de corridas e criação, que era a situação de um operador independente, que tinha antes de tudo que sobreviver economicamente. Ele teve, portanto, que orientar seu ciclo operacional para essa necessidade primária. 

Para um criador-proprietário-treinador como Tesio, sobreviver economicamente não era apenas uma questão de vencer corridas comuns; qualquer dinheiro que isso pudesse trazer, não seria suficiente para manutenção e desenvolvimento da sua criação. E para vencer os grandes embates ele necessitava de cavalos que pudessem atingir as distâncias dessas provas na classe aos três anos e sustentar essa capacidade aos e além dos quatro anos. E isso, em sua visão, só poderia ser conseguido dentro de seus preceitos de cruzamento, ou seja, fugindo do excesso de brilhantismo - não confundamos brilhantismo com velocidade.



Em seu tempo a maioria dos outros studs competiam principalmente por prestígio, e se resignavam em perder dinheiro, desde que isso fosse contido dentro de certos limites. Sua situação nesse contexto era atípica, pois não podia se dar ao luxo de perder dinheiro, mesmo em quantias moderadas. Portanto, ganhar prêmios para ele não poderia ser um fim, mas um meio para um fim.

O verdadeiro objetivo de sua operação era poder vender a maioria de seus cavalos, uma vez que eles tivessem desempenhado suas funções nas pistas e consequentemente conseguir por eles preços satisfatórios.

Para que Tesio pudesse vender seus cavalos a bons preços, era necessário que ganhassem boas corridas, e quanto mais cedo melhor. Portanto, as corridas iniciais de primavera e verão eram os alvos necessários, para que ele pudesse começar a se livrar de seus cavalos excedentes até o final da temporada. Por sua vez, isso significava que ele poderia se dar ao luxo de continuar treinando seus melhores cavalos e depois apenas aqueles poucos em que se podia confiar, seja para ganhar prêmios adicionais substanciais ou para acompanhar e testar os cavalos mais jovens, enquanto todos os outros tinham que ser descartados. A eliminação das potrancas fora de treinamento era outro considerável problema, já que ele não tinha condições de manter muitas éguas reprodutoras nos 20 hectares de Dormello.

Por outro lado, para adquirir prestígio indiscutível, o que por sua vez significaria um mercado estável para seus cavalos aos preços que ele precisava obter, ele tinha que atrelar o desempenho de seus cavalos a algum critério indiscutível, e isso não podia ser encontrado apenas no programa italiano, teria que ser as corridas de primeira classe no exterior.

Na época de Tesio, as corridas inglesas eram voltadas para vencer o Derby e o St Leger aos três anos, enquanto o objetivo mais importante aos quatro anos era a Ascot Gold Cup. Esse ciclo era muito longo para o negócio de Tesio, e isso além da dificuldade para um cavalo estrangeiro ganhar corridas de prestígio na Inglaterra naquela época, e sem esquecer de mencionar os problemas de transporte envolvidos.

Ao lado da Inglaterra, um padrão para medir suas vitórias só poderia ser encontrado na França, e a primeira corrida de primeira classe que ele podia esperar na França era o Grand Prix de Paris. É irrelevante aqui discutir se hoje esse grande prêmio é realmente uma corrida de primeira classe. O que importa é que no tempo de Tesio os, naquela época, 3000 metros do Grand Prix de Paris era o evento continental supremo da temporada de verão. Vencê-lo era adquirir grande prestígio, e até os grandes studs ingleses participavam dele.

O Grand Prix de Paris era uma corrida realizada no domingo imediatamente seguinte ao Gran Premio di Milano, que por sua vez era também uma corrida de 3.000 metros, mas aberta para mais velhos, enquanto o Grand Prix de Paris era apenas para potros de três anos. Portanto, um potro que pudesse ganhar o Gran Premio di Milano contra cavalos mais velhos e, no domingo seguinte, também o Grand Prix de Paris contra os melhores 3 anos franceses, e possivelmente também um ou dois ingleses, teria um status indiscutível no melhor potro continental da temporada. Isso, por sua vez, criaria grande prestígio e garantiria um mercado superior não apenas para o próprio cavalo, mas também para seus companheiros de cocheira.

Não se pode ter certeza de que essa foi, palavra por palavra, exatamente a linha de pensamento de Tesio, mas não apenas coincide com o que ele realmente fez. 

Tesio nos 20 hectares de Dormello nunca teve mais do que 15 reprodutoras em serviço.