segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Varola - Análise de tendências - 5ª parte

 


The Tetrarch (by Clarence Hailey), cópia sem edição da foto original.






(continuação)


A grande lacuna de todos os estudos realizados sobre pedigrees e sobre as linhas de sangue - consistem eles na classificação por famílias, segundo Bruce Lowe, o índice de vitórias médias segundo estes, as dosagens de Vuillier ou índice das distâncias segundo a "Throughbred Breeder's Association" é dar indicações a posteriori e não a priori. Na atualização das dosagens de Vuillier, que estou tentando realizar, proponho-me adotar, entre outras coisas, uma nomenclatura que permita dar um pequeno, mas importante passo à frente em direção do conhecimento a priori do resultado do cruzamento. Anteriormente, afirmei que se examinarmos o puro-sangue em seu complexo como uma população, com todas as suas manifestações psicológicas e sociológicas, distinguiremos, como primeira consequência urna divisão em grupos que, para ser prático e breve, reduzi a cinco, chamados, respectivamente, brilhante, intermediário, clássico, robusto e profissional.

Não foi por acaso que estes cinco adjetivos substantivos foram expostos precisamente nesta ordem; com efeito, se modificássemos tal disposição, perderíamos todo o resultado da pesquisa. Estas cinco palavras devem de fato ser, interpretadas no mesmo sentido em que se interpretam os grupos de deputados sentados no hemiciclo parlamentar, isto é, da extrema esquerda à extrema direita, passando pelo centro. Em outras palavras, a população do puro-sangue contém, justamente como a humana, seus revolucionários, seus progressistas, seus moderados, seus radicais e seus reacionários.

Posto o raciocínio nestes termos, poderá parecer um contra- senso que eu tenha, por exemplo, classificado Phalaris, Nearco e Hyperion entre os brilhantes, que seriam, afinal, os revolucionários, mas na realidade a definição tem fundamento, porquanto eles são os principais responsáveis pela revolução nas posições do predomínio inglês em favor da França; são indivíduos brilhantíssimos, com grandes capacidades transmissoras, mas jamais se pode contar com seus descendentes típicos para enfrentar provas realmente severas, nas quais, ao contrário, já há muitos anos, vêm triunfando os vários descendentes de Teddy, Rabelais ou Vatellor, que os franceses sabem produzir em fluxo permanente. Estes últimos, na linguagem por mim proposta, pertencem à centro-direita, ou seja, ao grupo dos radicais (geralmente, nas discussões políticas, consideram-se os radicais como homens de esquerda, mas é uma ilusão).

Analogamente, um Son-in-Law, um Hurry On, um  Precipitation, um Alycidon, trazem em si as características de um extremo conservantismo, porquanto, não conseguem, a não ser rara e esporadicamente, escapar ao esquema rígido e bem definido, que os faz protagonistas de determinadas provas em determinadas distâncias, como é demonstrado pelo fato de que, só em 1963 no Derby Italiano foi inscrito entre seus vencedores o nome de um descendente de Son-in-Law, chamado Braccio da Montone, gerado, contudo, por um garanhão francês Vandale, no qual as primigênias qualidades de solidez a toda prova combinaram-se com o ecletismo francês.

O mesmo acontece com os dois grupos dos intermediários e dos clássicos, que correspondem à centro-esquerda e ao centro, ou seja, aos progressistas e aos moderados. Quantas vezes não se falou da diferença entre os dois irmãos próprios Fairway e Pharos?

Pois bem, Fairway é um revolucionário um tanto perigoso, enquanto Pharos é simplesmente um progressista de notáveis qualidades individuais. O uso de Fairway reserva sempre surpresas amargas; de Blue Peter, que serviu principalmente para produzir modelos magníficos de cavalos de montaria, Tesio soube extrair Botticelli, que porém era um cavalo bem difícil de ser utilizado, e de Botticelli nasceu Antelami, que naufragou no St. Leger de Doncaster de uma maneira que nem sequer conseguimos imaginar pudesse acontecer com um Ribot ou um Tenerani.

Ao contrário, quem usa Pharos, sabe que pode contar com um certo resultado mínimo garantido e algumas vezes tem a agradável surpresa de ver superado esse mínimo. Assim, o uso de Bozzetto, Signal Light, Brueghel, etc., produziu resultados animadores nos mais diversos ambientes e até mesmo de El Greco, que, em termos imediatos, foi um malogro devido à sua fragilidade intrínseca, mas que mereceu uma reprodutora que deu origem a Ribot, que foi muito além da expectativa.

No centro de nosso alinhamento, encontramos justamente os clássicos, ou seja, os que realizam o perfeito equilíbrio, que, como todos sabem, é coisa muito rara e de fato, durante todo este século, pouquíssimos produtos pertencentes a um número de estirpes ainda mais restrito conseguiram elevar-se a este cobiçado pedestal: 

1) Swynford, Blandford, Blenheim; 

2) Rock Sand,Tracery;

3) Gainsborough; 

4) Tourbillon; 

5) Count Fleet;

6) Bull Lea; 

7) Prince Rose;

e isto no que diz respeito aos únicos chefes-de-raça por mim considerados como tais e prejudicar as atualizações que estou preparando.

Mas, como o hemiciclo parlamentar e a própria sociedade não poderiam viver apenas de expoentes de centro, também o puro-sangue não poderia viver apenas de sumidades  clássicas. Um produto com pedigree inteiramente baseado cm Blandford ou em Gainsborough seria talvez uma perfeita peça de museu, aias faltar-lhe-ia ainda algo para ser realmente vivo. Este "algo" deve provir da colaboração de todos os grupos genealógicos e, por esta razão, ouso esperar que a escolha de um número suficiente de chefes-de-raça, por dosagens, expoentes dos cinco grupos, possa servir para individualizar com precisão maior, a priori, o tipo de cavalo que se deseja produzir. Com isto não pretendo dizer que a dosagem em si e por si permite conhecer por antecipação se o resultado será um derby-winner ou um handicapper, mas apenas que a dosagem, observada e aplicada em muito tempo dentro dos limite da lógica e do bom senso, deverá, necessariamente, aproximar de tudo o que foi precedentente programado, segundo as intenções e necessidades do criador.

É verdade que este resultado também pode ser observado empiricamente, pelos criadores que cruzam suas reprodutoras com "o que há de melhor ao mercado", porém, corre-se o risco de seguir demais a moda e a moda faz brincadeiras de mal gosto na criação do puro-sangue porque, como tem sido fartamente demonstrado, pode fazer que o concorrente estrangeiro vença importantes provas das competições internacionais nas quais a derrota do país hóspede não é representada pelos milhões do prêmio que vão para o exterior, mas pelo incremento do valor do mercado dos produtos do país convidado, que significa uma automática perda de possibilidades por parte do pais hóspede no sentido de fazer valer os mesmos preços no exterior no mesmo momento, considerando a enorme diferença de valor do mercado existente em qualquer momento e o pais entre o primeiro e o segundo colocador em unia grande prova internacional.

Tomemos, como exemplo, o pedigree de uma potranca de êxito, Claudia Lorenese. Nele encontramos 30 chefes-de-raça, entre os quais 5 brilhantes (Cicero, Phalaris 2x, Nearco, Hyperion), 6 intermediários (Havresac II 4x, Pharos, The Tetrarch), 3 clássicos (Gainsborough, Blandford, Swynford), 13 robustos (Rabelais 5x, Spearmint 4x, Chaucer 2x, Sunstar, Teddy), e 3 profissionais (Hurry On 2x, Rayardo). O diagrama de Claudia Lorenese, portanto, é 5-6-3-13-3, ou seja, um pedigree robustamente assentado sobre as meias atas e, entre estas, com predomínio esmagador da centro-direita, isto é, presumivelmente, da tenacidade, da duração, do fundo. As alas, entretanto, vêm a ser um tanto fracas e, principalmente, o centro é fraco. Uma dosagem ideal, com efeito, seria 5-5-5-5-5 e, embora esta fórmula seja teórica e dificilmente realizável, contudo, com cruzamentos oportunos e sucessivos, seria possível chegar a uma aproximação e, cai todo caso, a um equilíbrio entre as cinco partes componentes.

O índice de consistência de Claudia Lorenese é de 5 : 5 = 5, isto é, mais do que suficiente pala uma campanha plenamente satisfatória, especialmente tratando-se de unia fêmea. Convém notar que todas estas considerações poderiam ser feitas no momento de decidir o cruzamento entre os pais de Claudia Lorenese: Tissot e Torre Paola.Não há, portanto, nenhum critério a posteriori, mas si uma avaliação a priori das consequências possíveis prováveis do próprio cruzamento. E mais: este exame a priori indica que, dos 30 chefes-de-raça da contagem, apenas 8 são trazidos pelo pai Tissot e cerca de 22 pela mãe Torre Paola.

A tendência à centro-direita existe, portanto, na reprodutora e pretendeu-se corrigi-la restabelecendo um certo equilíbrio clássico mediante o cruzamento com Tissot. Com efeito, se examinarmos o pedigree de Torre Paola do ponto de vista convencional, leremos a confirmação, por assim dizer, organológica: Star of Gujrath e Ninfa, de Cola D'Amatrice e Paranzelia, de Isso e Nacline, de Nesiotes e Naushon, de Burne Jones.

Os nomes da sequência Cola D'Amatrice-Isso-Nesiotes-Burne Jones são justamente elementos de centro-direita; nenhum deles é, individualmente, um garanhão chefe-de-raça, mas todos são portadores de características utilitárias. Acontece, porém, que Tissot, em têrmos genealógicos, é portador de elementos mais sólidos do que clássicos: de fato, seu diagrama é 1-2-0-4-1, isto é, também mais forte nas meias alas do que no centro, faltando-lhe, aliás, elementos clássicos e residindo sua força justamente no fato de que pode constituir um válido outcross com todas as reprodutoras já saturadas de elementos clássicos.

Pode-se supor, portanto, que ambos os partners deste cruzamento possam obter resultados ainda mais brilhantes, conjugando-se, respectivamente, unia reprodutora e um garanhão de características mais marcadamente clássicas. Mas este resultado será alcançado da mesma forma estudando-se um cruzamento adequado para Claudia Lorenese. Nesse caso, pode-se escolher um garanhão mais forte no centro do que nas alas e o resultado do cruzamento será um produto com um diagrama mais equilibrado e, ao mesmo tempo, com uma grande riqueza de presenças de chefe-de-raça.

Este processo é estranhamente simples e praticável por quem quer que seja com a máxima facilidade, mas, ao mesmo tempo, deixa certa margem à apreciações individuais, evitando o mecanismo excessivo de certos cálculos baseados na distância média dos pais e antepassados e que pretendem especificar quanto fundo, quanto meio-fundo ou quanta velocidade terá um cavalo em termos de metros ou jardas. Em sua base, naturalmente, existe o pressuposto de que a divisão dos chefes-de-raça em cinco grupos seja fundamentalmente exata e que os indivíduos escolhidos para formar os grupos sejam os corretos. Como se trata de uma escolha sugerida por um critério puramente pessoal, não é infalível, mas nada impede que cada criador, preocupado com o futuro de seu negócio, forme uma tabela pessoal, que poderá divergir da minha em escala maior ou menor.

Ao mesmo tempo, quero repetir que minha escolha de garanhões chefes-de-raça segue um critério critico e não estatístico e que nunca perdi de vista a noção de que o estudo do produto em si é mais importante do que o estudo de qualquer linha hipotética ou sucessão dinástica que, em termos gerais, com frequência é mais uma ilusão do que uma realidade. Com efeito, pode-se notar que pai e filho pertencem muitas vezes a grupos diversos: Swynford, Blandford e Blenheim são todos considerados clássicos, mas Alycidon encontra-se no grupo dos profissionais. Teddy acha-se entre os robustos, mas Bull Lea está entre os clássicos. Bayardo está entre os profissionais, mas seu filho Gainsborough está entre os clássicos e o filho deste, Hyperion, entre os brilhantes. Da mesma forma, o brilhante Nearco é filho do intermediário Pharos e da reprodutora, Nogara, filha do intermediário Havresac II, e, se no futuro for preciso acrescentar outros nomes à lista, provavelmente o filho de Nearco, Mossborough, merecerá um lugar entre os clássicos. Não existe, portanto, direitos divinos em minha lista, mas um exame individual que, todavia, necessita uma atualização constante. Estes instrumentos de medida exigem, com efeito, uma reavaliação continua e por essa razão a escolha de nomes suplementares impõe-se desde já, como espero apresentar no próximo capítulo.


(continua)