Elisie (F. Pereira Filho up), a melhor égua de sua geração, mais um cruzamento Reynato Sodré Borges. O Haras Tibagi nunca teve mais de 40 éguas em reprodução e produziu em 11 gerações à 18 vencedores de grupo.
Meu Caro amigo,
Na última carta eu figurava como exemplo (naquele lindo
sonho que tivemos), que a égua viria cheia da Europa para nascimento no 1º
semestre.
Então vamos pensar em adquirir éguas na Europa, cheias é
claro e compradas nos leilões de Newmarket ou de Deauville.
Lembro a classificação feita e, éguas de seleção são de
forma geral inegociáveis, pois seus possuidores não se desfazem delas ou nessa
possibilidade os valores pedidos são incompatíveis com o poder de compra da
nossa moeda e não ficam ao nosso alcance. Bom... há exceções, reconheço e
voltarei a elas no momento oportuno.
Restam então éguas de 1º time e do 2º time (não esqueça
que dada a cor local às de 2º, serão aqui de 1º time) que em muito melhorarão a
qualidade de nossos plantéis. Lembro a você que as éguas de seleção são aquelas
ganhadoras de provas de grupo e também éguas de campanha fraca ou sem campanha,
mas de boa linha materna e que produziram filhos ganhadores dessas provas
clássicas. O critério formador de seleção (como em futebol) varia com a
apreciação do técnico e mesmo com a época, mais ou menos rica de bons
exemplares. Já te disse que o julgamento para a escolha não é fácil e por isso
estabeleci essa comparação futebolística, tão bem entendida por todos nós.
Então, é indispensável estabelecer bons juízos para o julgamento seletivo. Nem
sempre a égua que ganha é a melhor. Ou melhor dizendo, não é somente o que
chega em primeiro, pois outros animais que se colocam no placar final são
merecedores de atenção, dependendo do desenrolar da corrida. E sempre a linha
materna deve dominar na escolha, não esqueça.
Conto um caso que é mais um ensinamento. Em um leilão de
potrancas francesas no Posto de Monta, o Haras Tibagi comprou AMETHYSTE, a
menor delas (1,50m), “quarteluda” dos pés, mal feita e não foi das de menor
preço, pelo contrário. Não vetei, porém não me entusiasmei pela compra mas, era
Celerina – Diavolezza enfim, Saint Astra, linha
das melhores do turfe francês. Não chegou a ganhar. Estreou com chance,
mas feriu os “machinhos” e fez papelão. Encaminhada a reprodução e com Nageur –
vencedor clássico de nobre pedigree e
correto tipo físico - produziu AMAZONE, vencedora de grupo. Veja você
como isto é sério e verdadeiro. A filha Amazone também não é grande, porém bem
feita e com qualidade, que demonstra mais uma vez que a linha materna é de
capital importância.
Também o nosso machismo pode servir de escolha na Europa
desde que você compre filhas de MILL REEF, RIVERMAN, CARO, LYPHARD e LUTHIER,
pois eles só servem éguas de seleção ou do 1º time, não só pelo preço das
coberturas como há implicitamente uma seleção, dado o número de solicitações.
Aqueles criadores que possuem mais de uma quota, enviam suas melhores éguas e
quando vendem uma cobertura é também para uma égua de alta qualidade.
O problema que preocupa os nossos criadores é o das éguas
importadas virem cheias para nascimento no 1º semestre. Eu também há alguns
anos achava isto um inconveniente, mas modifiquei meu ponto de vista. Cheguei
mesmo a propor a um dos nossos melhores criadores, a enviar éguas nacionais de
seleção e prenhas de garanhões nacionais, também de seleção, - cheias em temporada
europeia – para que seus produtos corressem primeiramente na Itália e Alemanha.
À primeira vista parece uma atitude pretenciosa, mas não a mim, que acho que o
cavalo bom, é bom em qualquer parte do mundo. É, sem dúvida, dispendioso, mas
não a quem quer projetar sua criação na Europa, usando como cabeça de ponte
turfes com qualidade técnica similar ao nosso, e daí ter a possibilidade de
abrir um mercado ao nosso PSC. Mas, voltando ao nascimento europeu (1º
semestre) dos produtos de éguas importadas cheias. Já tínhamos o exemplo de
ADIL (Epigram), QUIPROQUÓ (The Phoenix) e PLATINA (Blue Train) para citar os
que foram excepcionais no nosso turfe. Eles eram resultantes de seleção com
seleção? Não, e no máximo do bom com bom. E repare que tiveram campanhas longas
e clássicas e foram criados como os seus contemporâneos de haras, porém têm
eles um denominador comum que é o fato de suas mães os terem aleitado sem estar
gerando outro em seu ventre. É frequente em haras de ponta europeus, os
criadores não servirem suas éguas todos os anos e isto me chamava a atenção.
Verifiquei mais tarde, que os produtos das éguas que pariam no 1º semestre em
nossos haras, serem comparativamente mais fortes que os de nascimento normal
(2º semestre) e isto só se pode justificar pelo fato da égua dar tudo ao recém
nato e não ter que dar nada a um produto em gestação.
O interesse comercial é que força os criadores a quererem
que suas éguas tenham produtos todos os anos. E não sabem alimentar... Em 1964
estive no Haras de Jardy e conversando
com o stud groom, disse-me em resumo,
que a égua vazia come x, a que está prenha come 2 x e a com cria 3 x. E isto é
lógico e de bom senso.
Dentro da lei natural, a fêmea quando aleita, não ovula.
As mulheres simples sabem disso, (que quando aleitam os filhos até 1 ano ou
mais, não engravidam). A égua também e só ovula pela excitação do macho (daí a
rufiagem) ou com artifícios medicamentosos. E 1 ou 2 meses após o desmame,
apresenta ciclos com ovulação, mesmo sem rufiagem. Então a lei biológica é
contrariada na criação do cavalo de puro sangue de corrida.
Meu caro, pense nisso tudo. Reflita, pois é coisa nova entre
nós e acredite trará sorrisos aos céticos. Mas estou fazendo o que me pediu,
isto é, dando orientação. Também não falo que faças só o que aconselho, mas
peço que reflita sobre eles.
Então quando tiveres uma égua que venha a parir no tarde
novembro ou dezembro, não se preocupe e a sirva em fevereiro ou março.
Constatarás que estes produtos serão melhores fisicamente que os com nascimento
no final do 2º semestre e isto porque a égua aleitará, no mínimo, 5 meses, sem
ter desgastes pela gestação de um novo produto. Insisto que medite sobre o que
disse, pois acho que em sua política de élevage
poderás usar desse artifício com sucesso.
Voltando às éguas enviadas para a Europa, para parirem lá
e voltarem cheias. Os grandes garanhões de seleção não cobrem no 2º semestre e
assim elas só poderiam ser dadas a garanhões do 2º time e que não sejam
sindicalizados. Ora, esta possibilidade não nos interessa, pois nossos
garanhões de seleção são bons e a
cobertura não seria tão dispendiosa. Não há dúvida que você sempre poderá
encontrar um garanhão de 1º time e que seja propriedade de apenas um haras, e
posso citar EMBUIA, mãe da notável EMERALD HILL. Embuia é filha da craque
EMOCIÓN que foi levada à Europa para ser servida por SUNNY BOY, garanhão de 1º
time na França e que foi líder das estatísticas francesas de 1954.
Já expostos os não óbices do nascimento europeu, você
poderá enviar a égua do nosso sonho para ser coberta por um bom garanhão da
França, Inglaterra ou Irlanda. Nesse caso deves recorrer a agências como a
Flying Fox em Paris ou a B.B.A. em Londres. Elas possuem quotas de garanhões,
ou procuram daquele que desejar (é óbvio que são muito caros se forem do 1º
time). Também cuidam dos haras onde poderão estacionar, enfim de tudo que você
precisar em assunto turfe e são instituições corretas e merecedoras de
confiança.
Gostaria de alertar você para o fato de que só se vende o
que não se gosta. Caso um criador tenha 3 éguas da mesma linha, ele poderá
vender uma, e evidentemente, a que menos goste. Normal esta conduta, e então
observará que as melhores éguas que importamos, mesmo por elevado preço (para
nós), possui algum defeito, ou os pais são do 2º time e eventualmente do 1º
time. Ter um pai de 2º time, no meu modo de ver, é secundário para a nossa
criação, que está sempre ávida de boas linhas maternas.
E aí, chega um amigo seu, e “entendido”, e diz: como ele
só elogia as linhas maternas e tal égua que venceu um grande clássico, têm
ascendentes maternos desconhecidos? Você poderá retrucar, em meu nome, que isto
ocorre (raramente) e ocorreu durante 200 anos e assim se firmaram determinadas
éguas, como “éguas base”. E essa ganhadora, confirmando performances
semelhantes, poderá também criar a sua linha, mas isso só o futuro confirmará.
Mas sem fazer blague, aconselho você a comprar a que tirou 2º lugar tendo boa
linha materna.
Resumindo: forme seu plantel com estas 4 diretrizes:
1 - Compre potrancas em leilão que tenha boa filiação e com uma linha materna dominante, que sejam possuidoras de bom físico e oriundas de haras com bom padrão de criação.
2 - Compre éguas cheias que tenham boa linha materna e sendo possível, de haras em liquidação. Há um sucesso mundial nos leilões de liquidação, em razão de tudo ser vendido. Não há reserva e nem defesa.
3 - Comprar na Europa, éguas cheias de boa linha materna, mesmo (e são estas que estão à venda) com coberturas de garanhão de 2º time.
4 - Sempre estude os catálogos para identificar o ritmo de parição das éguas ofertadas cheias (se for uma égua com baixa fertilidade não interessa por melhor que seja o seu pedigree), o percentual de seus produtos que correram e o percentual de ganhadores.
E não se esqueça que o que se vende é sempre o que não se
gosta, mas não constitui óbice, pois se os gostos fossem iguais, o que seria do
amarelo. Lembre o que relatei da Amethyste, porque ela foi vendida tendo tão
boa linha materna? Porque além de pequena, era mal feita e ficaram na Europa
com outras melhores de físico e da mesma linha. Custou caro, mas valeu a pena.
Já estava no fim desta carta, quando chegou a sua pedindo
uma relação das boas linhas maternas do nosso turfe. Aí me complicou. Não tenho
mais aquela memória angélica da mocidade. Poderei citar somente algumas,
prometendo porem analisar as éguas ou potrancas que você estiver selecionando.
Os nossos catálogos são incompletos e quando muito, vão até a 3ª geração. Você
já deve estar assinando a “British Bloodhorse” e a “Course et Élevage” e
verificando como se faz um pedigree (até a 5ª geração e análise da linha
baixa). E quando folhear os catálogos de Deauville e de Newmarket, verá como
são bem esclarecedores. Mas vamos lá...
A linha da TACY e a da NUVEM me parecem excepcionais sendo
que esta égua deu 2 ganhadores do Cruzeiro do Sul – Derby brasileiro, TIMÃO e
ZUIDO, além de DIESE uma vencedora do Diana, todos pelo garanhão de seleção SWALLOW
TAIL, o que a primeira vista parece ser um nick
felicíssimo. Esta performance para uma mare
é gigantesca (faltou superlativo). A da NAVE também é boa e a de CARAN (EGEU,
HOMERO e GOLDANA), com garanhões diferentes e assim demonstrando que a boa era
ela mesma. A linha da EMPEÑOSA (EMERSON e EMPYREU) é também excepcional, assim
como a da DUTY (DULCE). Da CANTATA (agora LONG LADY, ganhadora da Taça de Ouro,
é filha da CANDI que é CAPRI que é CANTATA). A linha da JACUTINGA está
brilhando também. A explosão no Brasil da EASTERN SWAN e a da A.A. deverá
continuar.
As linhas europeias, são muitas e faltam-me dados além da
memória, assim como para as argentinas.
Para melhores esclarecimentos e detalhes, consulte o
Carlos Roberto Martins Costa, grande conhecedor do assunto.
Reynato Sodré Borges
Tebas – maio - 1979